(Jornal Público)
(Costuma ser em
regra assim. Sobranceria primeiro, trabalho e muito depois mas falta de sorte. É
assim o fado da ineficácia. Veremos
se afugentada a sobranceria e com muito porfiar dará para colocar a Hungria no
seu lugar.)
Há algo de recorrente
nas prestações a seleção. Bipolaridade que baste, ilusões coletivas criadas com
o discutido “Melhor do Mundo”, fraca propensão para jogar com equipas mais fracas,
sobranceria primeiro, esforço extra depois e, após muito porfiar, ineficácia,
muita ineficácia.
O jogo de ontem com a Áustria
insere-se na transição da bipolaridade eufórica para a perceção do real. Jogámos
bastante e trabalhámos muito. Ninguém o ignora. Alguma desorganização. Creio
que o nosso FS, como deve ter rezado o homem estes dias, nunca terá
experimentado com consistência o tridente Ronaldo, Nani e Quaresma, mas ontem
experimentou-o. Os números do jogo não enganam. A avalanche diferenciada é
inequívoca. Com aquela diferença de números, uma equipa menos insegura teria
praticamente goleado. Mas os postes estão lá para alguma coisa e representam
uma percentagem ínfima da superfície que tem de ser penetrada. A “angústia do
melhor do mundo na marca de penalty” poderia ser o título de uma peça de
teatro, transferindo a angústia do guarda-redes para o avançado, para
representar o drama da ilusão coletiva a partir de uma competência individual
excecional. É demasiada pressão sobre aquela cabeça e sobre aqueles ombros. A
pressão do gel e sobretudo de toda a carga mediática que pesa sobre a carreira
de Ronaldo seriam matéria bastante para derrotar qualquer um, o que não
acontece. Mas ter um país nas costas é peso a mais. Num contexto destes, nem
todos os santinhos do mundo ajudarão um desamparado Santos. Um exemplo: não está
na cara que livres do lado direito do campo de quem ataca não são propícios ao
pé esquerdo de Rafael Guerreiro? Ronaldo já marcou algum daquela posição? Isto
não deveria estar fixado à partida? Na partida com a Islândia, não foi patético
quase do meio campo Ronaldo tentar um livre direto, como naqueles jogos de
escola de boa memória havia sempre um mais que tudo a querer resolver todos os
problemas e a marcar todas as faltas, naquele modelo de a bola é minha, joga
quem quiser?
Abandonada a sobranceria
e a euforia, faremos contra a Hungria o que sabemos fazer, porfiar, trabalhar
até ao limite, esperando que a eficácia apareça. Se não aparecer, o país entrará
numa curta deceção, mas nada que não conheçamos doutras alturas e continuamos
por cá, as férias aparecerão com Jogos Olímpicos e tudo. É certo que os
problemas da Caixa e do sistema financeiro ganharão outra expressão, o futebol
será esquecido por uns tempos, mas a Supertaça já se desenha no horizonte.
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