(Como a mais
recente informação sobre população estrangeira imigrada em Portugal reflete com
algum desfasamento temporal o
modelo económico de que a economia portuguesa está a tentar libertar-se.)
O Público de um destes últimos
dias ofereceu-nos uma notícia bem documentada sobre os mais recentes dados sobre
a população estrangeira imigrada em Portugal, proveniente do Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo
2015. Trata-se de matéria relevante e proporciona-nos mais uma perspetiva
sobre que evolução de modelo económico estará o país a promover.
O panorama evolutivo
recente caracteriza-se em muito poucas palavras: descida acentuada de população
imigrada de expressão portuguesa, incluindo os brasileiros, mesmo assim representando
cerca de 21% do total de população imigrada em Portugal; descida também observada,
embora a um ritmo menos elevado, de população imigrada com origem na Europa central
e de leste; em contrapartida, aumento de população com origem em países
europeus, com destaque para França, Itália e Reino Unido.
O que é que estes números
e tendências traduzem em termos de modelo económico? A pergunta é óbvia. As
decisões individuais que conduzem as referidas populações a demandar o território
continente são naturalmente indissociáveis da perceção ou representação que essas
populações alimentam relativamente ao que por cá se vai passando em termos económicos.
Faz parte do mais elementar cálculo económico individual que precede uma decisão
migratória.
A descida das populações
de países de expressão portuguesa e do leste e centro da Europa traduzirá essencialmente
os efeitos da crise em geral e em particular da construção civil e de algumas
atividades ligadas ao mercado interno, como por exemplo a pequena restauração. De
um certo modo, poderá dizer-se que essa queda está em linha com a alteração de
modelo económico que, como é conhecido, embora por vezes pouco lembrado, teria
necessariamente de passar por um menor peso das atividades de construção civil
e obras públicas. O único contraponto a esta tendência seria a do florescimento
turístico que, tradicionalmente, sobretudo a sul, sempre viveu parcialmente do recurso
a população imigrada, mais propensa e recetiva à flexibilidade sazonal.
Interpretemos agora o crescimento
dos números relativos ao crescimento da população imigrada europeia, particularmente
franceses, italianos e britânicos. Uma explicação possível é que Portugal
estaria a transformar-se numa espécie de Riviera ou Côte-d’Azur atlântica, um sítio
calmo e aprazível, seguro, para acomodar os últimos anos de luz, sol e lazer de
população reformada. O que estará a passar-se não será a plena concretização
desse potencial de atratividade. O que estará a explicar o fenómeno será mais a
política pública de incentivo fiscal a essa atração de novos residentes, mais
provavelmente do que a história dos vistos gold.
Claro que as tais condições de amenidade e segurança pesarão, mas a sua influência
será mais a de completar o efeito do incentivo fiscal.
E a pergunta coloca-se,
naturalmente: mas que modelo económico estará esta mudança na população imigrada
a provocar? Em primeiro lugar, não deve esquecer-se que em matéria de stocks ainda é a imigração de expressão
portuguesa que domina. A imigração ocidental manifesta-se ao nível dos fluxos não
dos stocks.
Assim sendo, a receita
fiscal que o incentivo IRS aos estrangeiros representa (embora com desconto,
trata-se de uma nova receita de IRS) tem de ser completada com os benefícios
económicos que a atração dos novos residentes ocidentais estará a potenciar. E
aqui é que provavelmente nada se anuncia em termos de mudança de modelo económico.
Trata-se em primeiro lugar de um efeito sobre o consumo e sobretudo do impacto
na construção civil, mais no escoamento de parque habitacional já construído do
que propriamente em nova construção, embora esta tenda também a ser
incrementada. Em duas palavras, nada de novo em matéria de alteração de modelo
económico, o que é mau.
Tem, assim, razão o
coordenador do Observatório da Emigração Rui Pena Pires quando desabafa que: “Precisávamos
mais de uma população jovem, que pudesse ter filhos, e em idade ativa. Uma
parte substancial desta imigração que é atraída pelo regime fiscal para
residentes não habituais é uma imigração mais velha.” Acrescentaria eu que não é
apenas uma questão de não rejuvenescimento etário. É também o facto de nada de
novo a oeste em matéria de modelo económico. Esta questão ilustra bem a matéria
das escolhas públicas que tanto interessa a este blogue. É que em caso de rarefação
de recursos públicos, interessaria alocá-los preferencialmente em opções cuja probabilidade
de influenciar a transformação do modelo económico fosse mais elevada.
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