(Será que os tempos que correm nos vão transformar em réplicas de Calvin? Será que o negacionismo que campeia por aí pode ser interpretado simplesmente como a expressão máxima do egoísmo de comodidade? Ou é simplesmente o reflexo viral da estupidez, nua e crua, de mentes atormentadas e perdidas?)
Confinado em modo contemplativo, na mesa de trabalho, com o horizonte visual focado na frente ribeirinha galega do Minho, fronteira a Caminha, de iluminação típica de povoamento disperso e Santa Tecla lá no cimo, apenas com quatro a cinco pontos de luz a identificar a presença do monte, o cartoon de Calvin e Hobbes salta-me à vista e puxa-me para esta reflexão.
À medida que nos aproximamos das 23 são cada vez mais esparsos os pontos de luz que se movimentam na estrada ribeirinha do lado de cá, anunciando que se o dia se apresenta por vezes fervilhante de movimento, não aqui obviamente em Caminha, mas nas concentrações de atividade económica e demográfica, o recolhimento obrigatório está a ser fortemente respeitado. O confinamento de fim de semana é ainda uma incógnita, a mensagem política foi desta vez mais impositiva, mais clara, é mesmo para ficar em casa, e veremos que resultados irá ter. Os intervalos de tempo bastante alongados em que a redução obrigatória de contactos se repercute na diminuição de contágios registados prejudica seriamente a demonstração das vantagens destes confinamentos periódicos. E sinceramente que não percebo a política de não publicação de dados concelhios com regularidade. É paradoxal que Ministra e Diretora Geral de Saúde se esmifrem diariamente com números, repetindo quase até à náusea a sua presença em sessões diárias e, simultaneamente, os dados municipais continuam para publicação. Qual é a vantagem? Não será o mapeamento municipal e local um instrumento importante para modelar o nosso comportamento nos territórios em que vivemos?
A questão das vacinas é outra fonte de perplexidade. Não há sinais com alguma relevância que a vacinação contra a gripe e pneumonia pode reforçar a resistência ao COVID-19? Não se encheram as primeiras páginas dos jornais com apelos à vacinação generalizada e até Marcelo mostrou publicamente o seu tórax para incentivar a população? E agora a logística, sempre a logística como diz a Clara Ferreira Alves, vem frustrar expectativas, com a aparente justificação de que a procura nas farmácias foi anomalamente elevada. Mas será que este pessoal não sabe que as pessoas normais respondem a incentivos? Houve ou não houve um forte incentivo à vacinação? Cá por mim a unidade familiar do meu Centro de Saúde continua a funcionar com eficiência e atempadamente lá tive a minha vacinação. Mas não será de mau gosto e sinal de incompetência incentivar primeiro e frustrar depois? Não deveriam ser os médicos de família a decidir quem é população de risco para além dos limiares etários normalmente selecionados para identificar as prioridades de vacinação? Será que passou a ideia de que a ausência praticamente de gripe no hemisfério sul se estenderia á nossa situação e que afinal a decisão de vacinar em maior escala já não era assim tão importante?
Compreendo que muitos destes desencontros entre incentivos e frustração de expectativas pode levar muita gente à “filosofia” de Calvin. E nem sempre há os chatos dos Hobbes a chamar à razão!
Por agora estou mais Hobbes do que Calvin.
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