quinta-feira, 26 de novembro de 2020

A GRANDE FARRA PARLAMENTAR

 

(Se alguém tinha dúvidas de que a tramitação orçamental em Portugal equivale ao grau zero da política e da governabilidade espero que tenha encontrado nesta última semana a evidência que faz luz. A imagem que me ocorre é a de um festim e grande farra, com a irresponsabilidade à solta e com a revelação de que algo sucedeu pelas bandas do PSD ...)

O festim doeu de tanta irresponsabilidade e de “voando sobre um ninho de cucos”. A invasão descarada por opções de governo e pela tentação de alterar as suas condições não governando e fugindo dessa hipótese como o diabo na cruz levou a dinâmica parlamentar ao insuportável para a sensibilidade de um cidadão responsável. Ao pé deste festim as diabruras parlamentares do Ventura são uma brincadeira de crianças.

Parte deste festim deveu-se ao facto da lógica da tramitação da aprovação do Orçamento estar claramente desfasada da realidade atual. O Parlamento devia ter o poder de rejeitar um orçamento ou parte dele mas a passadeira vermelha que é aberta à possibilidade de o modificar sem que o governo que o propõe possa contrapor alternativas num novo documento descaracteriza a governação e o próprio instrumento orçamental.

Várias linhas vermelhas foram ultrapassadas sem a mais completa noção dos limites de toda a ordem que foram colocadas, entrando os deputados por matérias para as quais as propostas avançadas não têm seguramente a suportá-las qualquer investimento de quantificação de custos ou de investimento de preparação.

Toda a gente indiferenciadamente meteu a mão ao prato e a esmagadora maioria das alterações emergiu sem ter o mínimo quadro de negociação com o Governo e com o partido do Governo, pura chicana política, pequenas vinganças de esquina, produzindo um cenário de eleições na próxima curva.

Desta guerrilha orçamental já havia evidência de outros orçamentos. O que parece totalmente novo é o facto do PSD ter aparecido na grande farra, com uma agilidade digna dos grandes dançarinos e comensais. A aparente segurança com que Rui Rio aparece a explicar as razões pelas quais votou a proposta do Bloco de Esquerda quanto ao Novo Banco, abrindo caminho a uma torrente de batalhas jurídicas sobre o grau de cumprimento do contrato coma Lone Star, constitui um mistério insondável. Ou o homem não está bom da cabeça (estes homens do Norte expostos à usura da capital são muito vulneráveis) ou então algo de misterioso se passou na estrutura de poder que domina hoje (diria nos últimos meses) o PSD. Isto porque a mudança de postura e de atitude é de tal maneira brusca e brutal que o cheiro a poder não explica totalmente. O que se passou então realmente?

Para quem tivesse dúvidas de que o populismo mais instável e raivoso já está entre nós (e não é ao Chega que me refiro) recorde esta discussão na especialidade do Orçamento de Estado para 2021 para memória futura.

E tudo isto porque o anticiclone dos Açores está mais instável do que alguma vez já esteve! Eu bem dizia que as alterações climáticas também se fazem sentir na política, e de que maneira.

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