terça-feira, 10 de novembro de 2020

CRESCIMENTO: DA PANDEMIA AO RESTO

(Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt)

(a partir de https://www.dinheirovivo.pt e cálculos próprios)

 

Vamos, então, ao crescimento, matéria sobre a qual já aqui tivemos oportunidade de explicar por diversas vezes quanto não é fácil ao vulgar cidadão movimentar-se no mar de números e taxas que recorrentemente se lhes deparam. Dou um exemplo: foi recentemente anunciado que a economia portuguesa cresceu 13,2% no terceiro trimestre deste ano – uma boa notícia em si mesma (até fomos das economias que mais recuperaram no trimestre), mas uma notícia que ganha em relativização se recordarmos que a mesma economia tinha quebrado em 13,9% no trimestre precedente (e em 4% no primeiro). Complemento o exemplo: apesar de um crescimento trimestral positivo de 13,2%, a economia portuguesa apresenta-se no terceiro com uma variação negativa de 5,8% face ao trimestre homólogo de 2019 (ou seja, a economia portuguesa ainda é das que mais cai em relação ao ano precedente). Fiz-me entender?

 

Demos um passo mais: as previsões para o conjunto do ano de 2020 são variadas consoante as instituições (Governo, Banco de Portugal, Conselho de Finanças Públicas, Comissão Europeia ou Fundo Monetário Internacional) mas todas apontam para uma queda muitíssimo significativa, assumamos os mais recentes 9,3% da Comissão Europeia (a quarta pior evolução no conjunto dos 19 países membros da Zona Euro, conforme gráfico seguinte). Ora, aquelas previsões foram acompanhadas de outras, mais precárias porque mais longínquas no tempo, para os dois anos subsequentes; destas resulta que, em final de 2021, 18 dos 23 países europeus da amostra ainda estarão a níveis de PIB inferiores aos do final de 2019, número esse que passa a 10 se nos reportarmos ao final de 2022 (Portugal sempre incluído, naturalmente) – será de sublinhar, em especial, que a economia portuguesa terminará o próximo ano (2022 será talvez longínquo de mais para justificar grandes considerações) a um triste nível de três pontos percentuais abaixo do que tinha atingido dois anos antes (terceiro pior resultado europeu, apenas à frente de Espanha e Itália).



 

Temos, portanto, um problema de (não) crescimento agravado. O que é tanto mais de salientar quanto consumadamente se conhece a divergência da nossa economia em relação à média europeia desde a adesão à Zona Euro ou, se preferirem, desde o início do Século XXI. A pandemia veio, assim, reforçar esta má trajetória (levemente interrompida no primeiro governo de António Costa) e pôr a nu quanto é hercúlea a tarefa de enfrentar politicamente esta questão estrutural determinante. E é -o no contexto, que é o nosso, de recursos demasiado escassos para tantos objetivos a terem de ser considerados (seja por razões compreensíveis de ordem social e de sobrevivência, seja por razões menos compreensíveis de ordem mais estritamente politiqueira e de incompetência, seja por razões ponderosas de ordem funcional e de comando europeu, seja por razões cruciais de ordem estratégica e de orientação e preparação do futuro). No termo de tudo isto, sobrará o quê entre uma possivelmente reforçada cauda da Europa e algum catching-up que miraculosamente possa emergir?

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