sábado, 16 de junho de 2012

CENÁRIOS DE EURO-SOBREVIVÊNCIA

Ainda há quem se ocupe a procurar descobrir/explorar saídas construtivas no seio da incorrigível Zona Euro. Um dos casos mais notórios é o de Mark Cliffe, o economista-chefe que de Londres tem coordenado os excelentes relatórios produzidos pela equipa “Eurozone & Economic Strategy” no quadro da crescentemente prestigiada “Financial Markets Research” do Grupo ING. O acabado de publicar “Roads to survival – how EMU break-up could be avoided” é o exemplo mais recente e um dos mais marcantes, sendo justamente mercedor de um “flavour” em torno de breves apontamentos.


O estudo parte de dois pressupostos: o de que são cada vez mais os “céticos” quanto à atual via de uma “combinação de austeridade orçamental e reformas estruturais” e o de que há caminhos de sobrevivência possíveis. Utilizando uma lógica de cenarização a médio prazo centrada num mapeamento de três dimensões principais – os três R’s: reforma, reflação e redistribuição –, o trabalho desemboca em sugestivas “combinações estilizadas” (os grandes cenários estruturados no gráfico seguinte). Sendo que, por força da própria realidade e por imperativo metodológico, as mudanças políticas a ocorrerem nunca serão certamente bacteriologicamente puras (i.e., confinadas a uma das dimensões) e que haverá deslocamentos nas opções políticas e nas escolhas económicas, com as inerentes calibragens e alterações de trajetória.


Num extremo, “Austeria” é a extensão da prescrição advogada pelos germanófilos (um compacto de “austeridade assimétrica” e “destruição criativa”), agora finalmente assumida como “too big to succeed” e indutora de mais resgates. Nos outros extremos, dois cenários-limite: uma versão economicista do sonho federal (“Europhilia”, algures na transição entre uma “união de transferências” e uma “união orçamental”) e uma flexibilização agressiva da política monetária e cambial europeia com os inerentes riscos de generalização do protecionismo à escala mundial (“Inflationia”).

Pelo meio, os cenários de defesa mais factível a curto prazo da união económica e monetária europeia através de fissuras no atual círculo vicioso entre solvência de bancos e solvência de países, seja nos termos de uma “união bancária” (Draghia”) – incluindo um relaxamento da política monetária, recapitalização de bancos, garantias de depósitos, supervisão e procedimentos de resolução – ou nos de uma “união de financiamento” (“Bondia”) – juntando ao anterior uma evolução no sentido da emissão de “eurobonds”.

Os três cenários sobrantes (“Switzerland”, “America” e “Krugmania”) correspondem a variantes de uma “união de transferências” (entre menos pública e mais descentralizada, menos pública e mais liberal ou mais pública e keynesiana).

O quadro abaixo dá uma ideia das consequências direcionais de cada um dos cenários-base (somando-lhes ainda a identificação da questão “Grexit”) numa perspetiva de médio prazo (dois a cinco anos), assim permitindo aquilatar mais solidamente o que poderá vir a estar em jogo.


Termino referindo que este relatório foi a grande fonte inspiradora do artigo de Martin Wolf no “Financial Times” desta semana (“A new form of European union”). Arriscando alguma sobreposição, dele sublinho cinco ideias em cinco tópicos:
·         a Zona Euro está dominada pela improvisação e carece urgentemente de reformas que conjuguem a viabilidade política com a praticabilidade económica;
·         a sobrevivência da Zona Euro pode ser adequadamente pensada em termos de um desafio de reequacionação dos desequilíbrios externos e internos associados ao incontinente endividamento do pré-crise;
·         há alternativas que as presentes situações políticas e económicas descartam, da falhada receita da austeridade fiscal à hipótese de uma união federal em todo o seu alcance, passando ainda pela inexequibilidade de uma “união de transferências” (um sistema de transferências permanentes dos Estados membros mais ricos para os mais pobres);
·         a sugestão de se explorar uma combinação de duas ideias: uma “insurance union” (existência de apoio temporário e objetivado aos países atingidos por grandes choques, um mecanismo coletivo assente no princípio de que todos beneficiam da sobrevivência da união) e uma “adjustment union” (existência de ajustamentos simétricos a mudanças de circunstãncias, incluindo mudanças no financiamento, tendo por base a imprescindibilidade de maior despesa e inflação nos países centrais);
·         a ideia forte de que qualquer equilíbrio tem de ser largamente conseguido no interior da Zona Euro, designadamente devido ao facto de a economia mundial não apresentar atualmente condições estruturais para incorporar uma Europa excedentária.

Uma imensidão de temas para novas incursões…

1 comentário: