Este mote, com a marca de José Gomes Ferreira, uma obra
que marcou os meus anos vinte, abre praticamente o excelente discurso que António Sampaio da Nóvoa realizou nas comemorações do 10 de Junho.
Um discurso notável de um homem de saber, do saber, do
conhecimento, da educação, que se recusa a embarcar num naufrágio que hipoteca
a espantosa viragem que Portugal realizou nos últimos anos em termos de escola
pública, ciência e conhecimento e que corre o risco de produzir efeitos não cá,
mas fora por via da emigração dos mais qualificados.
Tenho a maior admiração por António Nóvoa e pela sua
independência de pensamento desde os trabalhos iniciais de um programa pioneiro
de formação-ação em Portugal, nos anos 80, mais propriamente de formação para o
desenvolvimento de agentes para intervenção local, no qual participei e durante
o qual tivemos o privilégio de contar com o saber inspirador de António Nóvoa.
Com um regresso a Roosevelt, Nóvoa lembrou-nos as coisas
básicas e simples da democracia, hoje bastante esquecidas num país fragmentado,
com a coesão a ser destruída: a igualdade de oportunidades, o emprego para os
que podem trabalhar, a segurança, o fim dos privilégios para poucos, a
liberdade para todos. Percorrendo pontos fortes do pensamento português (Antero,
Manuel Laranjeira, Teixeira de Pascoaes, Alberto Sampaio, Sophia, José Afonso),
António Nóvoa retoma o heroísmo das coisas simples, pensa a reinvenção da
sociedade portuguesa a partir de baixo para cima e das energias que vão nesse
plano desabrochando e chama a atenção para o ponto de viragem que é necessário
estabelecer na ligação entre a Universidade e a sociedade. Um país que chegou
onde chegou em termos de ciência, conhecimento e tecnologia não pode
desperdiçar essa viragem no nosso destino numa precária articulação com a
estrutura social e produtiva, numa débil transformação das instituições e
empresas, na incapacidade de a projetar para o interior das empresas com gente
mais qualificada.
Não há estratégia de futuro sem estratégia de transição a
partir do presente, por mais complicado que este se apresente.
O que António Nóvoa nos quis dizer é que o futuro capaz
de valorizar a viragem empreendida na ciência e no conhecimento pode ser
hipotecado se destruirmos esta nova base de recursos, se interrompermos a
caminhada de viragem conseguida nos últimos tempos. Para isso, são necessárias
escolhas públicas corajosas, hoje, ou seja, uma racionalidade para a consolidação
orçamental orientada por esta perspetiva de futuro.
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