Já aqui dei mostras da minha obsessão pelos meandros da
memória, sobretudo no plano literário e também cinematográfico. Por essa razão
e também pela própria personalidade em si, a obra de Jorge Semprún ocupa um
lugar de relevo nas minhas incursões pelo mundo dos livros.
Le
Fer Rouge de la Mémoire é uma coletânea que a Gallimard
acaba de editar, reunindo numa só edição simpática de cerca de 1160 páginas, cinco
obras em francês de Semprúm: Le Grand Voyage (1963), L’Évanouissement (1967),
Quel beau dimanche (1980), L´Écriture ou la vie (1994) e Le Mort quíl faut
(2001). Às quais se juntam uma série de artigos e conferências que se vão cruzando
com os contextos que determinaram as referidas obras.
As cinco obras são precedidas por uma minuciosa história
de vida e também de época, acompanhando o advento da Guerra Civil em Espanha, a
sua eclosão, o franquismo, a deportação em Buchenwald, a expulsão do Partido
Comunista, até à morte em 2011 de Semprúm, sempre num cruzamento de obra, de
vida, de referências dos seus livros e das inúmeras personalidades de políticos,
escritores, artistas, militantes.
Uma viagem fascinante pelos meandros de uma memória que
apagada ou silenciada trará a todos nós uma sensação perigosa de vazio de
referências.
O título da coletânea vem de uma passagem da talvez mais
popular obra de Semprúm em Portugal (Autobiografia de Federico Sánchez):
“Eh bien soit, je continuerai à remuer ce passé, à mettre
en jour ses plaies purulentes, pour les cautériser avec le fer rouge de la mémoire.”
(E, assim sendo, continuarei a remoer sobre este passado,
a expor as suas feridas purulentas, para as cicatrizar com o ferro incandescente
da memória)
O regresso a Semprúm é também a oportunidade de regresso
a uma língua que está também na minha memória, de uma beleza por vezes imensa de
que o anglo-saxónico dos papers e do economês me afasta mas nunca
definitivamente.
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