sexta-feira, 22 de junho de 2012

PARA PENSAR SOBRE A EUROPA


Ando definitivamente perdido com os horários da Quadratura do Círculo em época de “Euro 2012”. Vai-me valendo a gravação temporizada que a “Zon Box” disponibiliza, mas ainda assim não o suficiente para que o ataque empreendido contra as minhas rotinas me tenha continuado a permitir um acompanhamento do programa em cima do acontecimento – em suma, atrasei-me uma semana e só esta noite, já confortado pela vitória lusa sobre os checos, pude restabelecer a ordem numa agradável dose dupla: os debates de há oito dias e de hoje.

Deste releva a “condenação política” unânime de Miguel Relvas, o que já só não é reconhecido pelos social-democratas dependentes. Daquele importa reter para reflexão o posicionamento assumido por José Pacheco Pereira em relação às questões europeias, recuperando alguns pontos de vista que tem vindo a sustentar desde há alguns anos. Que o próprio assim sintetizou: “Qual é a principal razão pela qual caminhamos para o Euro? Era dar a uma economia supostamente única uma moeda única. E o caráter de bloco. O problema hoje é discutido essencialmente em termos financeiros, talvez se nós olharmos para a economia, em vez de apenas encontrar a pretexto da dívida soberana e dos problemas financeiros um ‘upgrade’, se tem sentido fazê-lo é em relação à economia, porque depois a moeda reflete o que acontece à economia. E isso implica coesão.” Matéria que desenvolveu conforme segue (os separadores são meus e visam apenas tornar a leitura mais apelativa):

·         O meu ponto essencial é – e é bom que ele seja dito agora – que na Europa as questões das identidades nacionais são um elemento fundamental. Não há um pensamento sobre a Europa que pense que na Europa é possível fazer um Estado federado ou uns Estados Unidos da Europa, ainda por cima em estado de necessidade e numa situação reconhecida por muitos como desigual. Não é possível. E, portanto, se nós vamos começar a mexer e a fazer engenharia política utópica para tentar resolver os problemas de curto prazo e os problemas da dívida criando uma situação em que na realidade vai haver um supergoverno europeu centrado essencialmente nas questões económicas e financeiras, é só uma questão de tempo até isto dar uma grande bernarda, muito maior do que a que existe hoje. E muito pior porque vai ser sobre questões políticas centrais e não tanto sobre questões de sobrevivência económica e de resolver os problemas da dívida.

·         Porque é evidente que o projeto europeu era uma coisa distinta. É por isso que as pessoas pensam que há uma continuidade e que há de facto um ‘upgrade’ político que é uma espécie de continuum desde a fundação – não é verdade. Porque há um elemento fundamental do projeto europeu, que é a coesão, que na realidade foi abandonado quando se reforçou o ‘upgrade’ político. O que aconteceu de há uns anos a esta parte, principalmente depois da queda do muro de Berlim – quando se verificou já em relação aos países que tinham entrado na Europa que era preciso gastar muito dinheiro para eles entrarem em condições de equidade, e os únicos, aliás, que estiveram dispostos a pagar foram os alemães que pagaram e ainda estão a pagar a integração da RDA, mas quando se pôs o problema da Polónia ou se pôs o problema da Roménia ou se põe o problema da Bulgária ninguém está disposto a gastar o que é necessário para garantir o equilíbrio dessa entrada.

·         Portanto, assiste-se a um processo que de facto devia entalar os europeístas, que é: por que razão é que, sempre que nos últimos anos se acelerou o processo de integração política e se fizeram tratados sobre tratados defendendo um ‘upgrade’ político – um dos quais aliás acabou, em bom rigor, com a regra da igualdade (…) e quem defendeu o Tratado de Lisboa e o tratado anterior na prática também assinou por baixo o fim dessa regra com o argumento de que era necessário encontrar um equilíbrio e uma eficácia na União Europeia –, o que acontece é o seguinte: é que nos últimos anos, desde a falhada Constituição Europeia, ao mesmo tempo que toda a elite política destes governantes europeus diz que é necessário fazer um ‘upgrade’ político o que é sempre cada vez mais enterrada é a ideia de coesão. A ideia de coesão, dita em termos um bocado brutais, significa que os países mais ricos paguem uma quota para o crescimento dos países mais pobres, ou seja, que países como a Alemanha, mas não só, façam uma transferência de parte dos seus recursos para os países mais pobres. Isso é uma coisa, outra coisa é saber se os países como Portugal, a Grécia, eventualmente a Irlanda usaram bem esse dinheiro. Mas muitas vezes usaram mal esse dinheiro porque o caráter abstrato dessas ajudas, impondo ajudas para determinadas áreas da atividade económica que aliás não eram as mais importantes, significa que ele foi deitado fora.

·         Portanto, o meu ponto é este: pensar que nesta situação de crise se resolve o problema sem voltar a uma ideia de coesão na base da independência e soberania dos povos e de um esforço de entendimento entre eles (...) e substitui-la por ‘upgrades’ políticos que nunca funcionam, porque todos os anteriores nunca funcionaram, a começar pelo Tratado de Lisboa, não serve para nada (…) e agora se nós vamos fazer um governo bancário europeu no Banco Central Europeu, se vamos criar uma integração política tornando falsamente federais ou pseudofederais a economia e as finanças, particularmente as finanças, vamos ter gravíssimos problemas de nacionalismo na Europa, que é isso que o projeto europeu pretendia evitar.

Um mar de questões interessantes e polémicas em torno da mais marcante e contraditória manifestação de construtivismo social dos nossos dias…

Sem comentários:

Enviar um comentário