No ATUAL do Expresso de hoje, António Guerreiro publica
um excelente texto de debate e discussão centrado no tema do fim da sociedade
do trabalho. Recorda nesse sentido duas obras que passaram pela minha formação:
The End of Work (1995)
de Jeremy Rifkin e Métamorphoses du Travail
(1988) de André Gorz.
O tema volta ao centro do debate sobretudo em função da
magnitude de desemprego estrutural em que, embora com grande diferenciação geográfica,
a economia mundial está mergulhada. António Guerreiro tenta explorar a incapacidade das
propostas focadas no crescimento que, à esquerda e à direita, têm sido
formuladas com base na não perceção do problema mais global que a evolução
tecnológica tem colocado estruturalmente ao capitalismo.
Em meu entender, o capitalismo enfrentou sempre
estruturalmente uma crise de insuficiência de investimento. Explico-me. A relação
investimento-criação de emprego é historicamente penalizada pelo facto do custo
do investimento necessário para criar um posto de trabalho nas sucessivas gerações
de progresso tecnológico ser sempre crescente. Aliás, sabemos pelas evidências
do longo prazo que o progresso tecnológico sempre aumentou a produtividade do
fator trabalho, embora tendendo a reduzir ou a estagnar a produtividade do
capital. Nestas condições, é sempre necessária uma maior quantidade de
investimento para assegurar a criação de um emprego adicional.
O que acontece é que, no longo prazo, a evolução da
procura permitiu atenuar essa insuficiência de investimento. Embora o progresso
técnico sempre destrua emprego a curto prazo, é esse mesmo progresso técnico
que o assegura nas mutações de longo prazo. Essa ambivalência explica a sempre
problemática relação dos sindicatos e trabalhadores individuais com as novas
gerações de “máquinas” com que têm de trabalhar. A nova máquina potencia o
aumento da sua produtividade individual (resolvidas que estejam os problemas de
qualificação e adaptação). Mas isso significa que a produção anteriormente
obtida pode ser concretizada com menos tempo de trabalho (horas) e a libertação
de um posto de trabalho é sempre uma possibilidade.
A magnitude do desemprego estrutural que grassa pelo
mundo económico sugere que essa insuficiência de investimento estará ao rubro. Claro
está que na situação atual parte dessa insuficiência de investimento pode ser
atribuída com segurança ao bloqueio de confiança que a situação gerada pela crise
da zona euro está a determinar. Mas o que a tese do fim da “sociedade de
trabalho” quer sugerir é que, mesmo que essa confiança seja recuperada, provavelmente
a insuficiência de investimento persistirá e com ela o desemprego estrutural.
Sabemos hoje que a inovação tecnológica é um processo indeterminado.
Começamos a conhecer os seus contornos históricos depois de concretizada. Não
antecipamos porém os seus novos rumos, as suas novas gerações de capitais e
configurações possíveis.
Dois novos temas devem ser adicionados ao debate do fim
da sociedade de trabalho: a mundialização das condições de trabalho e a
organização do tempo de trabalho em termos sincrónicos e diacrónicos (ou seja,
entre os que hoje têm e não têm trabalho e a organização do trabalho ao longo
do ciclo de vida).
O primeiro tem hoje evidências novas, pois nem todos os
tipos de atividades estão sujeitas a processos de outsourcing e deslocalização para “paraísos salariais” mais ou
menos desregulados. O segundo representa o grande desafio da organização social
de hoje e dos rumos da coesão social.
Voltaremos ao assunto.
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