segunda-feira, 26 de novembro de 2012

50 ANOS DO ICS



Mais um dia do périplo lisboeta, com manhã dedicada à Conferência do ICS, já que a tarde foi comida pela preparação da minha intervenção amanhã e por afazeres de trabalho.
No post anterior, sugeria que hoje seria uma manhã de Paul De Grauwe, dada a importância da conferência inaugural e a possibilidade de ouvir de viva voz a luta sistemática que De Grauwe vai realizando sobre a fragilidade da zona euro e a necessidade de compor o mais cedo possível esse defeito de fabrico.
Em parte não me enganei. Referirei em futuros posts alguns dos aspetos mais marcantes da apresentação de De Grauwe. Mas enganei-me em não antecipar o relevo da intervenção de António Nóvoa, que fechou a sessão inaugural. Tenho aqui um conflito de interesses. Acho que António Nóvoa é hoje um dos pensamentos mais lúcidos e desalinhados da sociedade portuguesa.
Numa curta intervenção, António Nóvoa partiu da história e do exemplo do GIS-ICS como espaço de liberdade de investigação, como força de pensamento para se referir depois ao projeto de fusão das Universidades Clássica e Técnica de Lisboa em termos simultaneamente apaixonados e de grande sentido estratégico. Denunciou pelo meio a deriva “austeritarista” de desvalorização das artes, das humanidades e das ciências sociais em geral determinada por uma perspetiva reducionista do contributo do conhecimento para o crescimento económico. Combateu a burocratização que inunda progressivamente a Universidade, geradora de um novelo de inércias e inépcias de todo o tipo. Assumiu-se como adversário acérrimo do pensamento atávico que vê o papel do País reduzido a um papel de intermediação, perdendo a ambição de sermos produtores de conhecimento. Denunciou os que tendem a projetar a mudança apenas para os outros, rejeitando-a para si próprios.
Gostaria de ter trabalhado numa Universidade com pensamento desta grandeza a dirigi-la. Não aconteceu. Mais uma perda que reconheço como irreversível.
Em posts seguintes, comentarei mais de perto a conferência de Paul De Grauwe, já hoje abundantemente reconhecida pelos media.
Por hoje, duas pequenas notas extraídas da fase de perguntas e respostas.
Primeiro, em resposta ao Embaixador alemão presente na sala, De Grauwe referiu que não compreendia porque é que a Alemanha não estava a aproveitar o financiamento a prazo de 10 anos a taxas inferiores a 1% para se financiar e introduzir uma dinâmica de investimento crucial para assegurar focos de compensação ao ajustamento severo das economias sob resgate ou por ele ameaçadas. Só uma falta de imaginação de grande amplitude explicaria a não identificação de projetos com rendibilidades seguramente superiores a esse baixo custo de financiamento.
Segundo, numa interpelação final, o jornalista Ricardo Costa procurou encontrar da parte de De Grauwe uma abordagem ao caso português que o conferencista tinha sempre equacionado no âmbito mais geral das economias do sul. Na troca de palavras que aconteceu e face a uma referência de Ricardo Costa ao ministro Vítor Gaspar, De Grauwe referiu que era seu amigo, mas que não era seu conselheiro. Ao que Ricardo Costa respondeu, com gargalhada geral da circunspecta assembleia, que Vítor Gaspar era também nosso amigo e que também não lhe dávamos conselhos.
Uma nota final para as últimas palavras de De Grauwe: se queremos preservar o euro, teremos de saber construir um novo país, a Europa. Esta alternativa continua a desprezar a possibilidade de construção de um novo sistema, indo ao baú das mais profundas convicções de Keynes, baseado no respeito de moedas nacionais e na criação de uma moeda comum apenas para as relações internacionais.

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