Da passagem de Nuno
Cardoso pela Câmara do Porto e pela política local certamente não rezará a história.
É de facto difícil encontrar fundamentos válidos e consistentes para que isso
acontecesse, embora possamos reconhecer alguma injustiça no modo como a opinião
pública local o envolveu em processos cujo desfecho jurídico veio repor o bom
nome da personagem. É também difícil descortinar razões para uma certa ambição
política que protagonizou, mas também nessa dimensão não é exemplo único. A política
local está cheia de ambições não condizentes com o sumo das personagens.
Compreende-se que a
gestão do pós-poder tenha sido difícil. Todos sabemos como os aparelhos partidários
podem ser cruéis, sobretudo para os que com eles convivem em tom desafiador. Há
sempre os momentos certos em que os aparelhos cobram ou executam sentenças de
marginalização ou afastamento. É também conhecido que Nuno Cardoso sempre
encontrou em Luís Filipe Meneses (LFM) algum apoio e reconhecimento. Não posso sequer
imaginar se tal apoio é sincero ou se resulta do síndroma agudo “contra Rui Rio”
ou seja “quem o combate meu amigo será”. Para os efeitos da análise pouco
importa. Basta reconhecer que Nuno Cardoso pertencerá “aos amigos de Meneses”. E,
nessa qualidade, tem todo o direito de apoiar quem bem entender. Se NC se
reconhece no estilo e prática de poder de LFM, estará no seu direito de
reconhecer o apoio prestado e participar na caminhada para o Porto. Nesse plano
não seria matéria para este blogue.
Mas, hoje no Público,
NC protagoniza uma alfinetada em Rui Rio em torno do tema da fusão de Porto e
Gaia, agitando de novo a ideia parola de associar a essa fusão o lema do Porto “mais
forte, a maior cidade do país e um grande dínamo da economia do Norte”. Exemplos
deste Porto serôdio há-os para aí aos montes, incapazes de criar uma trajetória
própria para a Cidade, menos tributária das questões da dimensão. Imaginar hoje
que a cidade do Porto pode ser dínamo da economia do Norte cheira a romagem a
cemitério, acompanhada de discursos empolgados, até retoricamente interessantes,
mas desprovidos de qualquer consistência.
O tema da fusão e dos
ganhos de escala para as cidades e neste caso para o Porto-Gaia tem de ser democrática
e estrategicamente combatido, simplesmente porque exacerba os princípios da
eficiência e ignora outros aspetos como os da eficácia, da “accountability” e da transparência da ação
municipal. Conhecendo bem a engenharia de governação do poder local, aumentar a
dimensão média de municípios que, à escala europeia, já são das mais elevadas
em termos demográficos e territoriais, significa colocar em perigo a eficácia
da gestão, a “accountability” dos
atos municipais e o estabelecimento de relações fluidas, claras e transparentes
entre munícipes e governo local.
Mas haverá espaço para
alguma recomposição territorial do espaço Porto-Gaia? Em minha opinião e creio
que outros a partilharão, sim. Mas a sua concretização exigiria o fracionamento
do território de Gaia em dois. A Gaia ribeirinha e urbana poderia perfeitamente
integrar a cidade das duas margens. Mas com a condição de se formar um outro
município de Gaia estruturado por exemplo em torno dos Carvalhos, hoje um nó de
interconexões no interior do próprio município.
NC admite mesmo
que, a prazo, Matosinhos poderia integrar o projeto. E a ambição poderia não
parar por aí. Há quem explique a estes senhores que a descentralização democrática
não acaba no nível do poder municipal por mais importante que este se
apresente?
Ora, como toda a gente
bem compreende, NC prepara espacialmente o terreno para a ambição e ego de LFM.
Não lhe terá ocorrido
que, no quadro da governação metropolitana, há outras fórmulas de melhor respeitar
os interesses dos cidadãos, transformando em matéria de voto decisões que
afetam a vida de todos nós mas que não se manifestam na vida municipal?
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