terça-feira, 20 de novembro de 2012

INTERESSES EM FLOR

Uma reportagem de fim de semana num jornal televisivo trouxe-me à memória a promessa por cumprir de aqui me referir ao cada vez mais badalado fenómeno das chamadas PPP’s (parcerias público-privadas). Faço-o, numa perspetiva deliberadamente pouco técnica e até grosseira, recorrendo a cinco curtos “flashes”.

1.       Um espantoso registo quanto ao grau de abuso daquele instrumento financeiro em Portugal, a um ponto tal que tornou o país numa espécie de “campeão mundial de PPP” (número 1 do mundo em termos de investimento em PPP em percentagem do PIB, conforme apresentação na OCDE pelo Observatório das Parcerias Público-Privadas da Universidade Católica).

  

2.       Uma indicação, entre várias alternativamente possíveis, quanto às astronómicas consequências daquela utilização excessiva de PPP’s, seja em termos do volume financeiro envolvido – no setor rodoviário, que é dominante, uma recente auditoria do Tribunal de Contas estimava a respetiva fatura em mais de 40 mil milhões de euros até 2050 – ou, como se referia na reportagem da TVI, em termos do seu fardo anual: em 2011, os valores pagos foram superiores a 1500 milhões de euros e ascenderão, a partir de 2014, a 2000 milhões de euros (um subsídio e meio de Natal de todos os portugueses, funcionários públicos e privados), mantendo-se depois acima dos 1000 milhões de euros até 2030.

 

3.       Um sublinhado quanto aos grandes beneficiários da situação em causa, quer através do modo como aquela auditoria se referiu a um aproveitamento pelas concessionárias e pelas entidades bancárias (ver abaixo algumas das composições acionistas mais relevantes), quer através do modo como o jornalista da SIC José Gomes Ferreira a descreveu (“a história de um grande conluio entre políticos, bancos e privados”), quer ainda através da abordagem do Prof. Fernando Nunes da Silva na AR (“PPP’s serviram para transferir dinheiros públicos para a banca”).

 

4.       Um interessante e contraponível sublinhado quanto ao modo quase ingénuo como João Cravinho, ministro de António Guterres ao tempo do lançamento das chamadas SCUT’s, veio confessar que “Portugal não estava preparado para negociar PPP”.

  

5.       Uma nota final quanto ao modo como a lógica “troikista” a que estamos submetidos limita a disponibilidade atual das escolhas mais racionais para o país. Como referia a peça da TVI, aquele Observatório propôs uma compra das antigas SCUT’s com vista a reduzir a enorme ameaça representada pelos pagamentos anuais devidos às concessionárias das PPP’s: seriam assim 3,5 mil milhões de euros a pagar em 2013, mas tal dispêndio iria permitir poupar 600 milhões de euros por ano e evitar novos pedidos de reequilíbrio financeiro até ao final dos contratos; ou seja, estaríamos perante uma oportunidade de trocar uma dívida financeira do Estado às concessionárias, que está a ser paga a 16%, por uma dívida pública que seria paga na casa dos 3%. Só que aquela compra aumentaria instantaneamente a dívida pública em 2 a 3 pontos percentuais e isso seria conflitual com os interesses da Troika…
 

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