A aplicação do
memorando da Troika está transformada numa grande representação, onde todas as
entradas de palco estão preparadas ao mais ínfimo pormenor, de forma a salvar a
face à generalidade dos intervenientes. Diálogos e deixas adequadas sobrepõem-se
sem que neste momento a trama ou o enredo interessem para alguma coisa.
A grande representação
ergueu-se acima da realidade, está suspensa e está hoje circunscrita a uma
estratégia de contenção de danos de imagem de cada um dos intervenientes. Funciona
quase em circuito fechado, a evolução da economia e da sociedade constituem um
simples pormenor, por mais subtis que possam ser consideradas as referências da
sexta avaliação aos aspetos mais críticos da aplicação do memorando – quebra das
receitas fiscais, desemprego descontrolado, rigidez da despesa pública.
O paradoxo é que nesta
encenação de nada valeria reprovar o candidato. Aliás, bem antes da publicação
dos resultados, Frau Merkel já se tinha encarregado de comunicar a libertação
de mais uma tranche do acordo, sublinhando bem a inutilidade da sexta avaliação. Reprovar o candidato ou pelo
menos puxar-lhe as orelhas equivaleria a questionar o próprio memorando e nisso
nenhuma das instituições internacionais nele representadas está convictamente
interessada.
E bem no âmago desta
grande representação Vítor Gaspar não hesita em apelar à mobilização dos
portugueses para um projeto exaltante de cortar quatro mil milhões de euros e
ajustar a dimensão e papel do Estado à sua real capacidade de o financiar. Mantendo
a metáfora, esta tirada de Vítor Gaspar equivale a um improviso que alguns na
representação já classificarão de mau gosto. Afinal, depois de um largo tempo
de imposições unilaterais, de desrespeito pela concertação social, do mais
profundo desprezo por alguns grupos sociais, tira-se um coelho da cartola e
apela-se à mais exaltante mobilização social em torno do encolhimento do Estado.
A grande representação continua. A única interrogação que subsiste é a de saber
quando é que, abruptamente e por que via, ficará claro que a encenação acabou.
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