segunda-feira, 12 de novembro de 2012

NEGACIONISMO UM POUCO PATÉTICO



A visita de Frau Merkel concretizou-se sem que aparentemente se antevejam grandes consequências práticas da sua passagem por Portugal. E não foi só o ritual de segurança. A encenação foi outra. Tudo se passou como se a aplicação do memorando de entendimento evoluísse no melhor dos mundos e o primeiro-Ministro apressou-se mesmo a concluir que o país concretizou em dois anos o que se esperava que levasse seis. Um ritual cerimonioso, laudatório da ação do Governo, com um guião anunciado, que não contribui rigorosamente nada para o impasse político em que a situação interna portuguesa se está a enrodilhar.
Chamar-lhe-ia negacionismo patético, porque ignora a dimensão e incerteza da crise europeia e sobretudo a alteração radical das condições em que o memorando de entendimento foi anunciado. Ignorando essa dimensão, ignora inevitavelmente as consequências do abrandamento da economia europeia sobre o próprio programa de ajustamento da economia portuguesa. Por conseguinte, uma visita calculista, determinada pelo tempo político da chanceler e não por qualquer outro motivo de impulso de melhores condições para o ajustamento em curso.
Tão patético como o foram as considerações macias do bem prega Marcelo Rebelo de Sousa (MRS), seja comentando as desventuras do filme que promoveu sobre o desagravo nacional para alemão ver, seja anotando ele próprio a necessidade de uma reconsideração dos pressupostos do memorando a partir da recessão europeia anunciada. Que MRS só agora tenha descoberto o que há muito outros anteviam, ou seja que conceber programas de consolidação orçamental para as economias do sul não entrando em linha de conta com a situação global europeia constitui um erro de palmatória, já não me espanta. A sua argúcia política não tem equivalente na sua literacia económica, que é vulgar, muito vulgar. O que me espanta é MRS reconhecer essa contradição e impossibilidade e, mesmo assim, limitar-se a invocar macia e bondosamente a necessidade de novos termos de aplicação do memorando sem qualquer mediação política para o fazer. Com quem concretizar esses novos termos da negociação? Com o atual governo? A encenação da visita de Frau Merkel inviabiliza quaisquer veleidades de acreditar nessa solução.
Assim sendo, parece que teremos de esperar pelas primeiras evidências da incapacidade de aplicação do orçamento de 2013. Não é brilhante e sair-nos-á do corpo.

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