(Para além das muitas e perversas interpretações sobre a
controvérsia das comemorações do 25 de Abril na Assembleia da República, o que
conta para mim, para lá do dever de respeitar a data, é a empatia emocional com
a mesma, que sentimos ou não. Este ano, em pleno
confinamento, talvez a empatia de muitos seja perturbada. Mas, diria eu, em
situação de emergência, mas com a democracia a funcionar, razões mais fortes
existem para conservar essa empatia. Afinal, pela maneira relativamente
equilibrada como estamos a gerir esta crise de saúde pública e pelas exigências
democráticas que a superação da crise económica, vamos precisar da energia
coletiva que Abril estimulou e que alguns souberam renovar ao longo do tempo.
Escrevo enquanto
assisto online à Metropolitan Opera At-Home Gala (www.metopera.org) que simbolicamente
inscreve o Abril Confinado de hoje num contexto de que não tínhamos
experiência. Comemorar algo que pertence ao nosso coletivo recente num contexto
de padecimento largamente partilhado por todo o mundo, embora estejamos em
diferentes estádios de manifestação da pandemia.
Deste dia fica-me o
excelente discurso de Marcelo, fazendo boas almas meter a violinha no saco
quando à prescindibilidade da data e da comemoração, remetendo tal hipótese
para o nível da “vergonha cívica”. Bastaria tal nota para justificar a
comemoração. Cerimónia contida, seguindo escrupulosamente as regras da
disciplina sanitária, honrando um Parlamento que se tem mantido sereno apesar
de alguns discursos incendiários, temos gente.
Quanto ao simbolismo
da Grândola das 15 horas é difícil em confinamento perceber qual foi a adesão
real à ideia da Associação 25 de abril. Os portugueses só muito raramente se
libertam totalmente para este tipo de manifestações. As reportagens televisivas
são sempre insuficientemente ilustrativas, mas vi sinais de empatia, embora sem
poder associar-lhe qualquer ideia de representatividade. Na RTP ressaltou
sobretudo o contraponto entre os rostos de Jerónimo de Sousa e de Catarina
Martins (duas gerações) interpretando na varanda e janela, respetivamente, das
suas sedes em Lisboa, a canção de Zeca Afonso. Uma unidade apenas simbólica à
esquerda, já o sabemos. Gostaria de ter visto no confronto algum dirigente do
PS.
A tarde cai e, sob o
comando do Diretor-geral do MET Peter Gelb e do Diretor musical Yannick Nézet-Séguin, a
gala do MET partilhada das casas de algumas das vozes mais representativas da
ópera contemporânea, Roberto Alagna e Aleksandra Kursak em La Raincy (França), Renée
Fleming na Virgínia (USA), Jonas Kauffman em Munique, Erin Morley em New Haven,
Elīna Garanča em Riga na Letónia, Sir Bryn Terfel no País de Gales, Sonya Yoncheva
em Genebra, René Pape em Berlim, Diana Dacrau em Orange França, Anne Nebretko
em Viena (infelizmente pré-gravado) e muitos outros, é a companhia ideal para
fechar o Abril confinado em partilha com o mundo da sensibilidade.
Graças ao Raul Calado
que anunciou e apresentou o evento no Expresso Revista.
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