(Uma das prováveis consequências do vendaval pandémico
que estamos a enfrentar é a ocorrência de mudanças no reconhecimento, ia dizer
valor, social de alguns agentes e profissões. Tenho a perceção de que algo vai acontecer quanto ao reconhecimento social
do papel dos professores, se não fora por outros motivos pelo facto de alunos e
famílias aumentarem os seus níveis de convivência comum em torno da Escola e
das aprendizagens.
Tenho insistido na
ideia de que nunca deveremos esquecer o contexto de desigualdade em que as
práticas educativas acontecem, o que condiciona fortemente os seus resultados,
e o seu recrudescimento em tempos de invenção e adaptação pedagógicas. No
pressuposto de que não o esquecemos e que as políticas públicas intervirão
futuramente no sentido de recriar melhores condições de equidade na
aprendizagem, tenho a perceção de que estão a acontecer coisas de grande
alcance nas práticas educativas que tem sido possível concretizar em tempo de
pandemia e confinamento. Claro que existe sempre o enviesamento de tentar
generalizar a partir do que nos é mais próximo. É também óbvio que as famílias
com condições logísticas e de organização do seu próprio trabalho desempenham
um papel crucial na função acompanhamento, antes exercida pelos professores em contexto
de sala de aula. É também possível que o ensino à distância tenha induzido
alguns professores a perder o equilíbrio nas cargas de trabalho exigidas aos
alunos. Tudo isso é admissível e tenho ecos de que não o devemos ignorar. Mas
que há coisas importantes a acontecer no âmbito de todo este processo
adaptativo parece-me evidente, pelo menos do ponto de vista do meu universo de
referências.
Um dos elementos
virtuosos da adaptação que tem vindo a corporizar o esforço coletivo é o da
criação de condições para uma mais razoável capacitação de alunos do ponto de
vista da autoformação. Gostaria de ter elementos mais minuciosos para verificar
se esta tendência está a disseminar-se por todos os níveis de ensino. Mas ao contrário
da tendência que alimentámos ao longo do muito tempo, os tempos de adaptação e
criatividade de hoje geram por inerência o estímulo ao trabalho pessoal do
aluno. Estamos no bom caminho e sou dos que penso que esse trabalho pessoal é
crucial para os alunos ganharem confiança e perceberem que o trabalho compensa.
Espero sinceramente que estas condições permitam com os investimentos adequados
em termos de metodologias pedagógicas que o ensino em Portugal passe a
valorizar mais a criatividade, a resolução de problemas, a autoformação e a
organização do trabalho pessoal.
Mas antecipo também
que todo este processo adaptativo de aprendizagem nos conduzirá a uma
recuperação pelo menos parcial do reconhecimento do papel dos professores. É
verdade que qualquer patetice governamental ou sindical conducente a novas
derivas de negociação pode perturbar a recuperação desse conhecimento. Mas apesar
desse risco acho que os professores vão subir lugares na escala do reconhecimento
do seu papel essencial. As crianças e os alunos em geral vão ser os portadores
da mensagem junto das famílias.
Percorrendo
matinalmente o New York Times que gostaria ainda, já na onda dos setenta,
poder ler em papel numa cafetaria de Greenwhich, Tribeca ou das imediações do
Central Park em Nova Iorque com American cofee e apple pie, encontrei esta bela
referência ao papel dos professores, que é uma boa forma de enriquecer o meu
ponto:
“Os professores são os
agrupadores (coletores) originais. Têm a responsabilidade de reunir um grupo e
de pensar como criar uma experiência para o todo, dia a dia. E os professores
estão no mundo da transformação. No fim de cada ano letivo, é pressuposto que
os jovens saiam mudados.
É uma tarefa de grande
exigência – particularmente agora, quando somos obrigados a limitar o que
podemos fazer em conjunto e que estamos a ensinar no Zoom”.
(link aqui)
(link aqui)
É bonito e tenho
grandes saudades dos meus tempos letivos de então, sem pandemia.
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