terça-feira, 9 de maio de 2023

ECONOMIA E GEOPOLÍTICA

 

(Desde a segunda metade da década de 2010 até aos nossos dias e, compreensivelmente, fortemente impulsionada pela invasão russa da Ucrânia, a geopolítica mundial entrou numa forte aceleração. Questões de segurança internacional, mas fundamentalmente novos posicionamentos face ao momento disruptivo da globalização, entraram em cena e novas siglas e terminologias povoaram as nossas referências de geopolítica internacional. Pode dizer-se que a China tomou a iniciativa e desencadeou um conjunto diversificado de reações com a sua “Silk Road Economic Belt Initiative” (1) e (2) ou também designada de “New Silk Road”, que não é mais do que um massivo projeto de grandes infraestruturas que, na prática, é um projeto de expansão da influência chinesa por um território vasto, com peso na geopolítica mundial. A reação mais proeminente a ocidente projetou-se sobretudo na dimensão da segurança, com o projeto AUKUS (3) que envolveu os EUA, o Reino Unido e a Austrália em projetos de tecnologias de defesa avançados que deixou a França de Macron furibunda e, como é habitual, a União Europeia a apanhar bonés. Mais recentemente, os EUA movimentaram-se no plano económico e do seu reposicionamento na globalização com duas grandes iniciativas, o Inflation Reduction Act (economia verde e energia) e o CHIPS Act (microprocessadores e componentes). Esta última iniciativa americana não consiste apenas numa tentativa de “reshoring” (regresso à base) de investimento direto estrangeiro americano espalhado pelo exterior, sobretudo na China, mas envolve uma dimensão curiosa de “friendshoring”, baseada na escolha de outras paragens mais amigáveis do que a China. É neste campo de procura de novas parcerias pelas bandas da Ásia, sempre a Ásia, que se começou a falar da Altasia, uma realidade geográfica que está longe de ser homogénea e que não é seguro que corresponda ao que os americanos chamam o tal friendshoring. Basta ver o mapa que abre este post, publicado pela revista The Economist para o compreender.

 


Li muito recentemente um artigo de Liza Tobin, Warren Wilson, Brady Helwig, and Connor Martin (4), investigadores do Special Competitive Studies Project (SCSP) (https://www.scsp.ai/), convidados de Noah Smith, que mostra bem como as questões da segurança, da geopolítica e da tecnologia avançada estão hoje irredutivelmente ligados. A preocupação dos autores é que o reposicionamento dos EUA face à China não implique o abandono americano do comércio global, devendo representar tão só a reconsideração de parcerias e a procura de uma maior autonomia tecnológica, que os EUA foram perdendo com a multiplicação da sua estratégia de localização do seu investimento direto estrangeiro. Mesmo relativamente à China e aos interesses económicos americanos aí representados, os autores defendem não o corte em rotura total, mas um desligamento progressivo, enquanto são criadas novas alternativas de parceria.

É neste contexto que o bloco de países da Altasia adquire um novo significado. O gráfico do Economist atribui-lhe uma importância global superior à da China para os indicadores selecionados e aposta sobretudo no crescimento dos custos unitários de produção na China como um fator de aceleração da deslocalização do IDE.


 

No entanto, quando olhamos para o mapa, compreendemos que está ali concentrado o campo de forças asiático que tem alterado profundamente a estrutura e dinamismo da economia mundial. Mas será que todo este universo de economias promissoras pode ser facilmente integrado na nova estratégia do friendshoring? Não duvidando da capacidade da diplomacia americana poder construir as teias da cooperação necessária, será que todas estas economias se ficarão pelo argumento económico do aproveitamento das suas vantagens competitivas face à economia chinesa? Tenho muitas dúvidas que sejam favas contadas.

Entretanto, a União Europeia vai comprando as ausências de solidariedade interna (caso da reação da Polónia, Hungria e também Eslováquia à possibilidade de importação de cereais ucranianos), não sendo visível qualquer iniciativa que se veja para contrariar todo este redireccionamento de influências.

O que não anuncia nada de muito promissor no futuro europeu na nova geopolítica em construção.

Entretanto, os Chineses vão fazendo o trabalho de casa. A produção de automóveis chineses ultrapassa já a de automóveis estrangeiros importados, como o refere o Financial Times:

 



(1) http://observatorio.repri.org/2020/06/16/a-iniciativa-cinturao-e-rota-da-seda-no-contexto-da-politica-regional-chinesa/

(2) https://www.cfr.org/backgrounder/chinas-massive-belt-and-road-initiative

(3) https://pt.euronews.com/2021/09/16/eua-reino-unido-e-australia-fazem-pacto-de-seguranca-historico

 (4) https://www.noahpinion.blog/p/a-demtech-economic-agenda-ten-steps?utm_source=substack&utm_medium=email



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