quarta-feira, 10 de maio de 2023

MAIS CRESCIMENTO

 
(Elaboração própria a partir de dados de https://www.imf.org

Já aqui me referi ao tema por diversas vezes e em diferentes registos, mas vai por aí um entusiasmo despropositado com os números do nosso crescimento que justifica a insistência. Nestes tempos mais recentes de crise política aberta, os comentadores agarraram-se com toda a força ao “excelente comportamento” da economia, como há dias aqui referi provenientes de o crescimento dos primeiros três meses de 2023 ter sido de 1,6% face ao trimestre imediatamente anterior e de 2,5% face ao período homólogo precedente ― bons sinais, como aqui então reconheci e tendo em conta que há poucos meses se temia um cenário de recessão, embora também confirmadamente muito tributários de uma mais forte retoma do turismo do que o previsto (vejam-se as declarações da chefe da missão do FMI que esteve em Portugal, Rupa Duttagupta, segundo as quais o crescimento forte “terá tido muito que ver com o turismo”).

 

Mas a notícia mais surpreendente chegou ontem com a divulgação do relatório de revisão da economia portuguesa por parte do Fundo Monetário Internacional (nos termos do estipulado no Artigo IV dos seus Estatutos) e a mais que duplicação da respetiva previsão de crescimento para Portugal para 2,6% em 2023 no espaço de um mês (de facto, em 11 de abril e no âmbito das suas previsões económicas mundiais, o FMI previra um crescimento de 1% em 2023 para Portugal ― mistérios da “ciência da previsão” ou talvez não...). Aquele valor atualizado coloca-se agora acima das projeções do Governo no Programa de Estabilidade (1,8%) e das de idêntico montante do Banco de Portugal.

 

Segundo referiu Rupa Duttagupta, mantem-se a expectativa “de um abrandamento gradual” mas, “mesmo que a economia não cresça nos próximos trimestres [uma estagnação associada a variações nulas em cadeia do PIB], o crescimento ficará sempre acima de 2%”. Dito isto, e focando-se no médio prazo, acrescentou: “Gostaríamos que o peso do investimento privado fosse maior. O cumprimento dos objetivos do PRR, como reforçar a digitalização das empresas e aumentar o investimento público, podem desempenhar um papel importante”. O que volta a trazer à tona o caráter determinante do investimento privado (e as indicações a este nível não parecem especialmente otimistas) e a decisiva importância complementar do investimento público (designadamente por via de uma aplicação mais expedita dos fundos comunitários). Como quer que seja, todas as projeções apontam para um crescimento a estabilizar em torno de 2% no próximo quinquénio, o que continua a deixar no ar a ideia de que não apenas a dinâmica económica em presença é de duvidoso grau de sustentabilidade como também de que persistem vivos os mais significativos fatores de bloqueio a um recrudescimento dessa mesma dinâmica económica.

 

Nem de propósito, foi igualmente ontem que Cavaco voltou a vir a terreiro, desta vez numa incursão partidária assumida, para manifestar a sua expectativa de que “os fundos europeus de dimensão nunca vista que estão a ser dirigidos para Portugal sejam utilizados para assegurar um crescimento da economia na ordem dos 3% a 4% por ano”. Chamo a este propósito a atenção para o gráfico que abre este post, designadamente no tocante ao que foram os períodos de crescimento económico português mais significativo, e acima ou largamente acima dos 3%, desde os anos 80 do século passado (1986/92 e 1996/2000) ― períodos, aliás, caraterizados pela primeira vaga de fundos estruturais associados à adesão comunitária e à preparação da entrada na moeda única; não seria de facto razoável pensar-se que poderíamos reaproximar a tais níveis se passássemos da agitação das “contas certas” a uma maior determinação no sentido de fazermos as coisas certas?

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