(As Nações Unidas acabam de publicar o Relatório Global do Desenvolvimento Sustentável de 2023 com o estado da arte do cumprimento dos 17 ODS estabelecidos em 2015. A situação não é brilhante na grande generalidade dos indicadores, mesmo tendo em conta que a pandemia ainda está perto e que a situação mundial não é a mais apropriada para uma bem-sucedida progressão no cumprimento das referidas metas. Em meu entender, o debate em torno da possível conflitualidade existente entre pelo menos alguns dos ODS não avançou suficientemente, mas esse não é o meu ponto de hoje. O que me interessa hoje destacar é que o estado da arte refletido no relatório da ONU suscita a centralidade do tema da transição para a sustentabilidade. O problema não está no cumprimento das metas estabelecidas, não ignorando o tema da conflitualidade entre algumas delas. A questão central está como alterar as situações de partida para atingir os referidos objetivos. Convenhamos que esta questão é largamente negligenciada no debate público sobre a matéria e isso justifica que seja tema do post de hoje, em clara associação com o post de ontem. Uma das diretoras científicas do Relatório, a alemã Imme Scholz, assina no Social Europe um empenhado artigo dedicado à necessidade de uma nova narrativa para assegurar avanços mais decisivos na transição para o desenvolvimento sustentável, que não deixa de ser uma outra forma de chamar a atenção para a importância do caminho da transformação. Assino por baixo. O problema central não está no incipiente grau de cumprimento dos 17 objetivos. Está antes no facto de não estarem em curso transições efetivas por mais lentas que possam ser. É um problema de caminhos, mais do que reconhecer que a meta será atingida muito além do tempo previsto.)
Algo que está adquirido no domínio do desenvolvimento sustentável é a conclusão de que existe ciência para apoiar transições mais efetivas para o cumprimento dos 17 objetivos. Em alguns domínios, existe em aberto um problema de translação económica do conhecimento, pois as soluções sustentáveis exigem a sua passagem para o mercado e investimento empresarial. A valorização económica do conhecimento enfrenta obviamente a indeterminação do próprio processo de inovação, mas haverá que convir que estamos hoje bem mais avançados, inclusivamente a nível nacional. O que interessa sublinhar é que existe ciência para essa transformação. A valorização económica do conhecimento faz parte do já referido processo de transição.
Exemplifiquemos.
Imme Sholz escreve: “Alterações de vulto são necessárias para acabar com a fome e parar a perda de biodiversidade. As pessoas nos países ricos devem reduzir drasticamente o consumo de carne, adotar dietas baseadas em vegetais multifuncionais e reduzir o desperdício alimentar. Globalmente, a agricultura deve adotar sistemas de produção com menos consumos intermédios e multifuncionais que preservem o soo, a água e a biodiversidade e a utilização de poluidores persistentes tais como metais pesados e plásticos deve ser drasticamente reduzida para assegurar um ambiente saudável”.
Este exemplo mostra a importância da transição e a importância de uma narrativa para acompanhar as transformações e a mudança de estratégias e comportamentos. E é aqui que a coerência da política pública é essencial para que essa desejada narrativa seja consistente. Só a política pública poderá cuidar da equidade das transformações, já que como sabemos as desigualdades existentes implicarão necessariamente custos diferenciados. E há também um problema em abeto que é o da equidade mundial, entre povos mais desenvolvidos e menos desenvolvidos a quem não poderão ser pedidos os mesmos sacrifícios e cedências.
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