Chegou a pontos de completa insustentabilidade a situação do Grupo Global Media (cujos títulos mais destacados são o “Jornal de Notícias”, o “Diário de Notícias”, a “TSF” e “O Jogo”), com salários em atraso, anúncios de despedimentos, um acionista com laivos fantasmagóricos, administradores duvidosos, ativos em desvalorização e greves dos trabalhadores. A comunicação social disso tem dado a notícia possível e feito a análise bastante. Daí que o meu ponto neste post não seja tanto o que insistir nos factos e nas perplexidades que vêm sendo sublinhados mas um outro, embora paralelo e articulado: refiro-me ao facto de o processo de destruição em curso do grupo em questão já vir de longe e, sem querer entrar em pormenores desnecessários, de decorrer largamente das movimentações acionistas que o têm caraterizado desde os comparativamente gloriosos tempos da Lusomundo do Coronel Luís Silva (Portugal Telecom, Controlinveste de Joaquim Oliveira, António Mosquito e Luís Montez, o grupo macaense KNJ Global, o grupo Bel de Marco Galinha e, atualmente, o misterioso fundo World Opportunity Fund, com uma figura como Daniel Proença de Carvalho a pontuar como uma presença duradoura e relevante enquanto presidente de 2014 a 2020 e vários ruídos de fundo sobre o papel que tiveram ou ainda têm nos caminhos do grupo alguns artistas da nossa praça e de outras); ilustro o raciocínio subjacente com uma interrogação: a que corresponderá realmente a afirmação de ontem no Parlamento do atual administrador executivo do grupo, o controverso José Paulo Fafe (um testa de ferro junto com o não menos controverso administrador Luís Bernardo), segundo a qual “continuamos a ser surpreendidos por factos, negócios ou procedimentos feitos no passado”?
Neste quadro, a proclamada como decisiva importância nacional do JN, do DN e da TSF e a adicional e enorme importância regional do JN levam-me a interrogações de fundo sobre o que andaram a fazer vários responsáveis nacionais de todos estes anos (entre ministros da Cultura ou tutelas da Comunicação Social, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social, as Câmaras Municipais mais diretamente próximas das tradições e dos interesses cidadãos envolvidos ou as elites de certas regiões, com destaque para as empresariais do Norte que tanto apreciam mostrar-se recorrentemente dispostas a fornecerem capital a projetos de moda e dotados de escasso potencial de afirmação e alavancagem regional) – toda esta gente, de um ou outro modo, terá pecado por omissão ao assistir sem reação ao prolongamento de situações pouco claras, à divulgação de decisões erradas e ao agravamento crescente das dificuldades financeiras de um Grupo que os acionistas iam fazendo sobreviver à custa de uma exploração inventiva e destrutiva dos ativos lucrativos. E, mesmo sabendo que o modelo de negócio do setor da comunicação social está em profunda crise em Portugal e não tendo grandes ilusões quanto às capacidades cívicas, estratégicas e financeiras dos nossos ditos “melhores”, recuso ainda assim a ideia de que nada possa fazer-se em tempo útil para evitar o descalabro iminente (ou, talvez melhor, para minimizar os já praticamente irreversíveis estragos); nem que seja, para liberal ver, através de uma intervenção do Estado sob as diversas hipóteses de que se tem falado (aperto administrativo e regulatório aos proprietários e gestores, suspensão de direitos de voto e retirada do controlo da empresa, utilização inteligente da participação na Lusa, nacionalização revertível, etc.) ou outras. Estarei talvez a ser ingénuo ou voluntarista mas, ainda assim, prefiro dar uns berros a baixar os braços.
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