(Depois de uma das
mais irritantes Quadraturas do Círculo de que me recordo, também não podia ficar indiferente ao tema do
amigo mediador do primeiro-ministro António Costa)
Pacheco Pereira estava particularmente irritado na sessão
de ontem do Quadratura e, dado o contexto, o alvo não podia deixar de ser António
Lobo Xavier, pois de Jorge Coelho não pode esperar-se nem um salpico de controvérsia.
A única explicação plausível para tal irritação só pode ser a do incómodo real
provocado pela mais que descuidada posição de António Costa acerca do seu amigo e
mediador Diogo Lacerda Machado. Com um contexto tão problemático de governação
que se abre ao governo de António Costa, abrir fendas de moto próprio parece suicida
e na minha perspetiva é-o de facto.
Pacheco Pereira trouxe para o debate a tese de que a
figura dos mediadores políticos informais é comum nas democracias ocidentais e
trouxe mesmo casos da sua própria participação em processos dessa natureza. É
relevante registar essa prática como não atentatória das regras democráticas. Mas
no caso do amigo mediador de Costa não me parece ser essa a questão essencial,
mas antes as das incompatibilidades e conflitos de interesses que podem estar
associados a este modus faciendi. Nestas
questões da negociação pública, há diferenças a estabelecer e nas matérias de
negociação económica de que estamos a falar estamos perante áreas críticas da
economia portuguesa, na qual, como é conhecido, não brotam oportunidades como cogumelos
em terreno húmido. Por muito que nos custe, a mediação do amigo de António Costa
não é equivalente à liderança de uma comissão de revisão do IRC como a que António
Lobo Xavier assumiu. Mesmo nesta última comissão, António Lobo Xavier não é uma
personagem universitária independente, totalmente equidistante do poder económico.
Não estou a discutir a competência na matéria e até a ética negocial de António
Lobo Xavier. Poderia questionar-se se a atribuição da liderança de uma comissão
desta natureza a uma personalidade com esta inserção profissional não
proporciona vantagens inequívocas não do ponto de vista remuneratório mas na
perspetiva da sua inserção profissional. Mas tenho de admitir que as condições
de escrutínio público e de “accountability”
de uma comissão desta natureza são bem mais salientes e favoráveis do que as do
estatuto do amigo mediador do primeiro-ministro.
Resumindo, é desolador confirmar que a máquina pública não
tem hoje entre os seus quadros gente suficientemente competente para assumir papéis
de mediação negocial com um mandato político claro e transparente. Ou essas
pessoas existem e estão simplesmente perdidas num gabinete qualquer, fruto de
sucessivas alternâncias democráticas? Mas vamos admitir que não existem, que o
estado de depauperação técnica da administração pública está no seu auge, que o
PS, o Bloco Central e a direita contribuíram à sua maneira para essa desertificação
preocupante. Pode o primeiro-ministro chamar à sua colaboração gente competente
para o assessorar nestas matérias da negociação económica, preenchendo a falha
de recursos humanos da administração? Claro que pode, mas não propriamente
segundo um modelo de alter-ego político, uma espécie de António Costa 2. É necessário
assegurar que se trata de personalidades escrutináveis e sem conflitos de
interesses. O argumento da confiança e da amizade percebe-se mas é perigoso. Será
que António Costa não confia nos seus ministros? O apagamento do ministro da
Economia é tal que me interrogo se vale a pena manter o cargo.
O António Costa que me perdoe mas quando votei no seu
programa não tive em conta os amigos de confiança que ele desejaria colocar a
gerir a coisa pública. Por isso, se o tencionava fazer impunha-se que, com
contrato ou sem contrato, fosse claro na apresentação da sua equipa que prolongaria
a atividade do governo. Nestas matérias e tendo em conta a exiguidade da
economia portuguesa, a probabilidade de uma qualquer atividade gerar conflito
de interesses é elevada. E à mulher de César … Mesmo considerando que é tudo
boa gente, competente e zeladora do interesse público, como aliás todas estas
discussões costumam começar. Mas que país este que esgota a sua energia nestas
questões e adia perigosamente os grandes problemas.
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