(A convite da Presidência
da CCDR Lisboa e Vale do Tejo estive ontem em Lisboa para uma discussão aberta sobre
como consertar o que está neste momento torto, ou seja tentar resolver a desconformidade
hoje existente entre a organização territorial para efeito de Fundos Estruturais
e a que decorre da lógica de planeamento)
É conhecido que o critério ainda hoje crucial para
determinar o acesso das regiões aos Fundos Estruturais é o rendimento per capita medido à paridade de poder de
compra. O acesso pleno aos Fundos Estruturais fica restringido a regiões que não
atingem um determinado limiar do rendimento per
capita europeu. Pode questionar-se em que medida a União Europeia não
consegue trabalhar critérios mais elaborados e se refugia numa medida tão
insuficiente, sobretudo em relação ao estado da arte do desenvolvimento
regional. Mas isso é matéria que fica para outra oportunidade. O que é
relevante assinalar é que, sendo o rendimento per capita medido para a unidade territorial e estatística NUTS II,
à medida que este vai subindo e permanecem nessa unidade territorial desvios
pronunciados de rendimento per capita
existe sempre a tentação de recompor essa NUTS II para permitir que as sub-regiões
menos desenvolvidas possam continuar a beneficiar do apoio dos Fundos
Estruturais.
A tentação não é exclusivamente portuguesa. Ontem, na
discussão, foi referenciado o caso da Alemanha, que operou também recomposições
de NUTS II com o mesmo objetivo. No caso da região de Lisboa e Vale do Tejo, a
primeira região em Portugal a experimentar esse problema, foi na altura
salomonicamente determinada que três NUTS III, o Oeste, o Médio Tejo e a Lezíria
fossem acomodadas as duas primeiras na área da CCDR Centro e a terceira na da
CCDR Alentejo. Como é óbvio, os municípios integrantes de tais NUTS III bateram
palmas, já que o estratagema lhes permitia continuar a aceder aos Fundos
Estruturais. O que não conseguiriam se tivessem continuado a pertencer à área
da CCDR Lisboa e Vale do Tejo. Simplesmente, tal decisão não alterou a dependência
de tais sub-regiões desta última para efeito de questões relacionadas com a orgânica
de planeamento, veja-se por exemplo as questões do ordenamento do território. Quer
isto dizer, que um autarca por exemplo do Oeste olha “para cima” em tudo que é
matéria de Fundos Estruturais e “para baixo” nas restantes matérias de
planeamento. Há que convir que não se trata de solução canónica. Seguramente
que não está também isenta de problemas de custos de transação. Do ponto de
vista político, a questão tem permanecido adormecida, mas como o atual governo
de António Costa pensa eleger os presidentes das CCDR a partir dos municípios,
a situação criada parece agora insustentável e reclamar conserto. Mas poderá
ser consertada?
Na reunião de ontem, para além de representantes políticos
das três NUTS III e do próprio Secretário de Estado e de quadros da CCDR Lisboa
e Vale do Tejo, estava presente uma espécie de grupo do costume (Félix Ribeiro,
João Ferrão, Jorge Gaspar, Josué Caldeira, Nuno Vitorino e este vosso amigo). Dizia-me
o João Ferrão à entrada da reunião que os protagonistas nesta área estavam
perigosamente a acantonar-se num grupo que tem dificuldade em renovar-se, e não
posso estar mais de acordo.
Voltando ao tema, embora a discussão fosse aberta,
percebeu-se pelas intervenções dos autarcas que a ideia a germinar seria reconstituir
uma nova NUTS II, composta pelo Oeste, Médio Tejo e Lezíria, e não ficou
totalmente esclarecido, aparentemente dando origem a uma nova CCDR, mantendo-se
Lisboa e Vale do Tejo apenas com a Área Metropolitana de Lisboa. No meu
entender, e expressei-o na reunião, quando se mistura propósitos de organização
territorial com aspetos meramente instrumentais, como os dos Fundos, tende a
abrir-se uma caixa de Pandora e o país precisa de uma organização estável para estruturar
o universo das políticas públicas. Félix Ribeiro trouxe uma perspetiva interessante:
a de que após um largo período em que os Fundos Estruturais foram utilizados para
desenvolver o território, é altura, com o fardo da dívida que temos, de os colocar
ao serviço do crescimento. Nessa base, a criação de duas regiões de planeamento,
contrariando a região funcional de Lisboa, retira aos territórios do Oeste, do
Médio Tejo e da Lezíria massa crítica de visibilidade internacional e estaria
em desconformidade com as exigências com que o País se confronta.
Embora me pareça que a conversa não terá agradado aos autarcas,
a síntese da discussão acaba por fazer-se em torno da ideia de criar uma nova
NUTS II (composta pelo Oeste, Médio Tejo e Lezíria), mas mantendo a CCDR Lisboa
e Vale do Tejo a funcionar com duas NUTS II, a Área Metropolitana de Lisboa e a
nova. O que na verdade corresponde a regressar às origens do projeto de
organização territorial de 1976 e a integrar a região funcional de Lisboa (por mais
elasticidade que este conceito possa ter) na área de intervenção da CCDR de
Lisboa e Vale do Tejo.
Resta a questão de saber como a criação da nova NUTS II
vai ser justificada em Bruxelas, passando na área de intervenção da CCDR LVT a
existir uma modulação entre duas NUTS II, o que parece não ser incompatível com
os instrumentos de acesso aos Fundos Estruturais.
Estou curioso em seguir a evolução da ideia, sobretudo do
ponto de vista da sua articulação com o poder político.
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