segunda-feira, 18 de abril de 2016

POR QUE RAZÃO ESTÃO OS ALEMÃES FURIOSOS COM AS TAXAS NEGATIVAS?




(Que as instituições europeias já há muito deixaram de ser europeias e agir como tal já o sabíamos, mas as evidências vão emergindo, uma a uma, de forma cristalina)

A crónica de Wolfgang Mϋnchau no Financial Times de domingo é bem reveladora como denúncia de uma hipocrisia alemã, que gosta de ser apresentada como a locomotiva da União Europeia e assim justificar algumas das tomadas de posição que assume, invocando o interesse europeu.

O argumento de Mϋnchau é demolidor, pois ele afirma preto no branco que o modelo alemão ameaça a estabilidade europeia. O que está em causa é a estranha posição do ministro Schäuble que questionou a independência do BCE e zurziu a bom zurzir nas taxas de juro negativas que o contorcionista Draghi tem sido obrigado a praticar para tentar sacar da política monetária o que não pode conseguir. Poderíamos imaginar que Schäuble é um ortodoxo monetarista e que por isso se torce todo com a “habilidade” das taxas de juro negativas. Poderíamos imaginar que o faz à luz dessas ideias e que até poderia estar a invoca-las na sua interpretação do interesse europeu.

Mas o cronista do Financial Times conhece bem o sistema financeiro e bancário alemão e sabe como o financiamento das empresas a partir do mercado de capitais é incipiente, comparando-o com práticas americanas. E sabe que a economia e a política alemãs dependem fortemente do sistema de banca de poupança. Ora, com taxas negativas, ou essa banca de poupança repercute para os seus aforradores esses custos que resultam de ter de depositar fundos no BCE. Se isso acontecesse, os aforradores alemães transfeririam as suas contas para contas seguras de depósito. Não será por acaso que, segundo Mϋnchau, Portugal e a Alemanha partilham curiosamente uma característica (não parecidos que nós somos!): os lucros antes de impostos dos bancos portugueses e alemães são fortemente penalizados pelas taxas negativas. Tão voluntaristas e exigentes a exigir reformas estruturais aos países da periferia, poderia perguntar-se por que razão a economia alemã mantem essa vulnerabilidade. O cronista do FT vai ao ponto de sugerir que isso não acontece dada a extrema cumplicidade que existe entre a política local nos Lander e o funcionamento dessa banca de poupança.

Com problemas desta natureza, que são a negação do modo como a união monetária deveria funcionar, não há projeto político europeu que resista. E o pior é que isso é cada vez mais evidente para quem esteja minimamente atento.

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