(É verdade que não estive a totalidade das cinco horas e muitos minutos a ver no Eurosport o combate de gigantes entre Rafael Nadal e Daniil Medvedev, com que terminou o Open da Austrália, mas estou certo que não me escaparam os momentos mais emocionantes de um jogo de ténis, algumas vezes incerto e com demasiados erros, mas que foi um prodígio de tenacidade, resistência e de combate físico e também tático. No Rod Laver Arena de Melburne (longa vida a um dos melhores de sempre) estiveram duas gerações de ténis, a que promete muitos títulos (Medvedev) e a que conseguiu vencer as atribulações de um ano de 2021 terrível, não só no plano pandémico, mas também do ponto de vista físico e pessoal (Nadal). Por isso, estou cansado de tanta emoção, ainda que o acontecimento-origem esteja do lado de lá do mundo.)
O embate entre Medvedev e Nadal tinha o interesse de se defrontarem dois tenistas cujo estilo não é propriamente aquele que se ensina na iniciação, mas antes o produto evolucionista da adaptação e aperfeiçoamento de características físicas muito diferenciadas dos dois atletas.
Com quase dois metros de altura e uma frieza que lembra, por vezes, a figura de Rasputine, Medvedev apresenta um ténis que é difícil de caracterizar, pois a sua esquerda, que curiosamente ele preferiu claramente neste jogo, fugindo muitas ao golpe de direita, talvez por se sentir mais confiante na pancada de esquerda, assenta numa posição algo encolhida e que explode por vezes quando desfere o seu golpe de esquerda saltando para bater a bola numa posição ainda mais alta e mais cedo. Medvedev opta regularmente por uma posição bastante recuada no court, posição que lhe valeu alguns dissabores sobretudo quando Nadal servia do lado esquerdo e abria o ângulo para níveis aparentemente impossíveis de alcançar a um vulgar mortal. O russo não esteve muitas vezes feliz na insistência em amortis, arma que Nadal utilizou na perfeição. Com uma vantagem de 2-0 e sobretudo depois de uma segunda partida em que ganhou brilhantemente, o russo foi-se perdendo na avassaladora recuperação de Nadal, que acabou por evidenciar uma resistência física que muitos admitiriam impossível depois de uma longa paragem e das complicações COIVID-19.
Nadal, que se aproxima a passos largos de um fim de carreira em glória, atravessa uma fase interessante de evolução do seu ténis, antes essencialmente físico, para agora assentar numa variedade de golpes, em que se destacam os já mencionados amortis, verdadeiramente letais, e uma variedade de esquerdas (cortadas e paralelas). Continuando a assentar o seu jogo na sua direita temível, forçando quase sempre o seu posicionamento no court para a utilizar, a verdade é que a mobilização dos restantes golpes foi apagando a resistência do russo e sobretudo quebrando a sua capacidade de cobertura do court.
21 títulos do Grande Slam é obra para o atleta espanhol que representará ainda durante muito tempo o lugar de excelência do desporto espanhol. Talvez no pódio, Djokovic, sobretudo se abandonar aquele espírito tão sérvio que o caracteriza, será talvez entre os três aquele que terá mais possibilidades de ultrapassar Nadal, já que muito dificilmente Federer ganhará mais algum Grande Slam. A resistência de Nadal é uma incógnita, mas antes de se consumar a sua vitória de hoje ninguém esperaria um regresso tão vigoroso.
Vai uma partida para desanuviar a pressão?
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