(INE, link aqui)
(Tenho de vos confessar que os termos em que por vezes o debate público é conduzido me tira frequentemente do sério, a ponto de me beliscar e colocar-me a questão metódica se estou a ouvir bem ou então se está tudo distraído ou a fugir para o louco. Este é para mim o caso do debate que se instalou versando as questões do salário mínimo e do salário médio, onde Deus meu, apetece recomendar a esta caterva de gente que pare um pouco para estudar e pensar melhor sobre as matérias em discussão …)
Comecemos por algumas ideias de base para repor a sanidade do debate.
Em primeiro lugar, sobre o salário mínimo, deve dizer-se que na literatura económica empírica não existe nenhum estudo credível que confirme o catastrofismo do argumento de que as sucessivas subidas do salário colocariam de pernas para o ar a economia. Um dos Nobel deste ano, David Card, conjuntamente com o precocemente desaparecido Alan Krueger mostrou até o contrário. E sabemos mais que o maior desincentivo à inovação é proporcionado por um quadro geral de salários baixos de que o salário mínimo é parte integrante. Enquanto o trabalho for abundante e a baixo custo, essa situação desincentiva a inovação, ou seja a substituição de trabalho físico de baixo custo por ideias ou capital físico que é outra forma de armazenar ideias. Os empregadores e seus representantes fazem o seu papel em invocar esse catastrofismo, mas isso não significa que tenhamos de o acolher acriticamente, até porque estamos a falar de subidas de salário mínimo acomodável e ainda por cima almofadadas por apoios públicos às empresas para permitir a adaptação.
Em segundo lugar, não podemos ignorar que o salário é uma realidade palpável, mensurável e à qual podemos associar pessoas (trabalhadores) concretas, enquanto que o salário médio é uma abstração.
Assim, quando politicamente se defende um aumento do salário mínimo, estamos a dirigir a nossa mensagem política a um conjunto de pessoas concretas. Porém, quando as forças políticas se encarniçam por um aumento do salário médio, a qual, tudo o resto constante, aumentará com a subida do salário mínimo, estão a dirigir-se a ninguém em concreto, pelo menos especificamente. O salário médio é uma abstração. Por isso, no extremo ele pode também aumentar se aumentarmos os salários do topo.
Por isso, nunca entendi o interesse de trazer para o debate político a questão do do salário médio, pois ela não corresponde a um conjunto específico de pessoas às quais possamos dirigir a mensagem política. Pelo contrário, uma mensagem política eficaz exige que consideremos níveis (intervalos) salariais concretos e não a abstração do salário médio.
Toda a gente estará de acordo que o escalão no qual a comparação internacional com salários potenciais alternativos é crucial é algo que se situará entre os 1.000 e os 2.000 euros brutos. É aí que se situa o problema central dos jovens que gostariam de entrar no mercado de trabalho com perspetivas remuneratórias compatíveis com as suas qualificações. É para aí por conseguinte que a mensagem política deve ser direcionada e é nesse contexto que ela tem de ser eficaz. O estéril debate em torno do salário médio não interessa nem ao Menino Jesus porque não se fixa em relação a pessoas e grupos concretos.
Acontece em matéria de salários algo de similar ao que se observa em matéria de impostos. É necessário clarificar que algumas das propostas que circulam por aí neste frenesim eleitoral, como por exemplo a da taxa flat de imposto, dizem respeito a percentagens de população mínimas e é necessário desmistificar essas propostas com um discurso do tipo: Sim, meu caro Amigo a sua proposta é bondosa mas ela é dirigida a percentagens muito pequenas de população. Eu pelo contrário quero falar para pelo menos 90% da população.
Assim, também no que diz respeito ao salário médio, temos que dizer aos que se projetam neste último e não no salário mínimo que estão a falar para uma abstração e que nós pelo contrário queremos falar para os jovens e trabalhadores em geral representados num determinado escalão salarial.
E claro que não podemos deixar de desabafar: mas que raio de gente está a assessorar o primeiro-Ministro?
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