(Foto Rodrigo Cabrita/Global Imagens)
Já foi aqui neste blogue analisada a entrevista de António
Borges ao Diário Económico, parcialmente reiterada em entrevista à SIC Notícias.
O meu colega e entusiasta deste blogue Freire de Sousa analisou em pormenor
essa entrevista e identificou na mesma imprecisões ou na melhor das hipóteses
afirmações pelo menos controversas. Tudo isto para além da proposta de redução
salarial como recuperação da competitividade da economia portuguesa e com ela
do crescimento económico. Já me referi ao assunto, denunciando o suicídio dinâmico
que tal descida implicaria para a economia portuguesa, invertendo sinais que o
cálculo económico empresarial terá começado a internalizar mediante
ajustamentos orientados para a inovação.
As imprecisões do senhor Borges começam a ser demasiado
frequentes. Já dei aqui o exemplo da sua interpretação quanto aos resultados da
governação de 1985 a 1995, cujos ventos sopravam de feição para a sua carreira profissional,
segundo a qual a economia portuguesa teria erradicado de vez o modelo da
competitividade-salário, para evoluir para um outro o da
competitividade-produtividade.
Nestes dias, alguém me lembrou uma outra aparição pública
do senhor Borges, mais propriamente num artigo para a revista EXAME de Outubro
de 2011. Nessa entrevista, para além de considerações sobre a desalavancagem da
economia portuguesa e comportamento do crédito que transcendem o objetivo do
post de hoje, o senhor Borges belisca já o tema da redução salarial. O que é
interessante notar é que o referido artigo foi objeto de um comunicado-esclarecimento do Banco de Portugal datado de 30 de Setembro de 2011. Parte desse comunicado respeita a imprecisões do artigo em torno do
problema do crédito e da redução do rácio crédito-depósitos decidido para a
banca portuguesa. Não é essa dimensão que me interessa destacar.
O aspeto relevante é a parte do beliscar do tema da redução
salarial.
No referido artigo, afirma-se que: “A perda de competitividade é estimada
pelo Banco de Portugal em cerca de 35% - o que significa que
teríamos de alterar o rácio entre os preços dos sectores protegidos e dos não
protegidos por esse montante”.
O esclarecimento do Banco de Portugal dessa data refere simplesmente
o seguinte: “As estimativas do Banco de
Portugal apontam para uma apreciação real
acumulada inferior a 10 por cento desde o início da área do euro (sublinhado
meu) (ver caixa “Custos unitários do trabalho relativos em Portugal: questões
metodológicas e evolução na última década” Boletim Económico do Banco de
Portugal, Verão de 2010). Estas estimativas encontram-se corrigidas do
enviesamento decorrente da metodologia de contabilização das transferências do
Estado para a Caixa Geral de Aposentações no âmbito das Contas Nacionais na
base 2000”.
Em meu entender, isto significa que o senhor Borges não é
lá muito bom a fazer contas, ou pelo menos a interpretar as contas de outros, e que lá vai cometendo as suas imprecisões ao
serviço de uma agenda que não se compreende muito bem qual é, já que é feita de
arremetidas e recuos. Qualquer um pode ter a sua agenda, por mais sofisticada
ou vulgar que se apresente. O que já não é aceitável é quando essa agenda mergulha
no interior do interesse público, sem escrutínio político democrático, ainda
por cima num tema tão central e decisivo para a clarificação das contas públicas
como por exemplo o tema das parcerias público-privadas.
E não são imprecisões inocentes. Bem podem personalidades
como Marcelo Rebelo de Sousa ou António Lobo Xavier vir em defesa do senhor
Borges atestando a sua competência profissional. Mas, face a esse tipo de
agendas, importa que não nos tomem por parvos.
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