terça-feira, 3 de julho de 2012

AS EVIDÊNCIAS INCONTORNÁVEIS


O tom geral do pensamento crítico ou de simples comentário que emergiu após a cimeira de 28 de Junho de 2012 pode caracterizar-se por uma expressão do tipo: um passo dado mas … ou, dito de outro modo, permanecem as questões cruciais por afrontar.
De facto, não podemos levar a sério o regozijo de Rajoy. Nas condições atuais de fragilidade na defensiva que o governo espanhol apresenta, o Primeiro-ministro espanhol tem exultado por qualquer coisa. Se matéria há para alguma esperança, talvez o comportamento da taxa de desemprego registado em Espanha dos últimos três meses, com tendência para descer e não para o seu agravamento, talvez lhe conceda alguma margem de manobra. Mas, com 50% de taxa de desemprego abaixo dos 25 anos e partindo da taxa global elevada que a Espanha apresenta, a corda é curta. E resta ainda conhecer o calvário de negociações e de pareceres jurídicos e pronunciamentos constitucionais sobre a questão de saber se o Mecanismo Europeu de Estabilidade poderá ou não proceder a recapitalizações diretas à banca espanhola. A apressada conclusão de que tal será possível sem alteração do tratado que consagrou aquele mecanismo parece não ser tão fácil assim.
Neste confronto de pronunciamentos, o de Münchau talvez seja por demais arrojado: Merkel seria em última instância a vencedora pois as responsabilidades alemãs não aumentaram de todo. Mas há que reconhecer que o clima global da negociação sofreu uma inflexão, por mais renitente e jogadora com o tempo que a posição alemã o seja.
Mas em simultâneo ou no pós-imediato da cimeira algumas evidências têm emergido suficientemente ilustrativas de que a mudança de rumo não pode ser apenas um estado de alma.
Hoje, por exemplo, é conhecido que, expurgando os juros da dívida, a Itália apresenta um excedente orçamental em torno dos 3%, em flagrante diferença quer com alguns países do Norte, quer em relação aos assistidos do Sul. Este número não será suficientemente eloquente para mostrar que o problema é outro, mais propriamente a incapacidade de definir um regime de competitividade para a zona euro que supere os desequilíbrios persistentes entre norte e sul (a própria Itália internaliza esse desequilíbrio geográfico)?
A outro nível, a taxa de desemprego média na zona euro atingiu o valor mais alto de sempre (11,1%), com mais um milhão e oitocentos mil de desempregados no passado ano e os valores do desemprego juvenil, com realce para a Espanha e para a Grécia, projetam-se para além dos 50%. Associar a superação destes valores à retórica das reformas estruturais foi chão que deu uvas: o problema de procura existe e não é pequeno.
Por cá, a progressão das falências/insolvências mostra a dura realidade da destruição produtiva, mas também o empobrecimento individual e familiar, bem visível no disparar das insolvências individuais.
E, last but not the least, vai-se confirmando que o Reino Unido enfrenta uma das mais lentas recuperações da sua história e, pasme-se, não ainda com perda assinalável do seu produto (queda de 0,3% no 1º trimestre de 2012) devido ao comportamento da despesa pública que, por mais tímida que se apresente, ainda constitui o único fator que contrabalança a incerteza reinante. O caso do Reino Unido evidencia bem que, aparentemente a salvo da trapalhada do euro, o mito da disciplina fiscal não passa disso. Só espero que o eleitorado britânico penalize o custo desnecessário desta lenta recuperação.
Com estas evidências todas convergentes, a prática de terapias como a em curso em Portugal (por mais pacientes que sejam os pacientes), com o pressuposto de que tudo vai bem no plano global, ficará na história económica recente como um dos produtos mais gritantes da imbecilidade doutrinária, quer esta fale alemão ou o mais puro “british”.

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