O tom geral do pensamento crítico ou de simples
comentário que emergiu após a cimeira de 28 de Junho de 2012 pode
caracterizar-se por uma expressão do tipo: um passo dado mas … ou, dito de
outro modo, permanecem as questões cruciais por afrontar.
De facto, não podemos levar a sério o regozijo de Rajoy.
Nas condições atuais de fragilidade na defensiva que o governo espanhol
apresenta, o Primeiro-ministro espanhol tem exultado por qualquer coisa. Se
matéria há para alguma esperança, talvez o comportamento da taxa de desemprego
registado em Espanha dos últimos três meses, com tendência para descer e não
para o seu agravamento, talvez lhe conceda alguma margem de manobra. Mas, com
50% de taxa de desemprego abaixo dos 25 anos e partindo da taxa global elevada
que a Espanha apresenta, a corda é curta. E resta ainda conhecer o calvário de
negociações e de pareceres jurídicos e pronunciamentos constitucionais sobre a
questão de saber se o Mecanismo Europeu de Estabilidade poderá ou não proceder
a recapitalizações diretas à banca espanhola. A apressada conclusão de que tal
será possível sem alteração do tratado que consagrou aquele mecanismo parece
não ser tão fácil assim.
Neste confronto de pronunciamentos, o de Münchau talvez seja por demais arrojado: Merkel seria em última instância a vencedora pois as
responsabilidades alemãs não aumentaram de todo. Mas há que reconhecer que o
clima global da negociação sofreu uma inflexão, por mais renitente e jogadora
com o tempo que a posição alemã o seja.
Mas em simultâneo ou no pós-imediato da cimeira algumas
evidências têm emergido suficientemente ilustrativas de que a mudança de rumo
não pode ser apenas um estado de alma.
Hoje, por exemplo, é conhecido que, expurgando os juros
da dívida, a Itália apresenta um excedente orçamental em torno dos 3%, em
flagrante diferença quer com alguns países do Norte, quer em relação aos
assistidos do Sul. Este número não será suficientemente eloquente para mostrar
que o problema é outro, mais propriamente a incapacidade de definir um regime
de competitividade para a zona euro que supere os desequilíbrios persistentes
entre norte e sul (a própria Itália internaliza esse desequilíbrio geográfico)?
A outro nível, a taxa de desemprego média na zona euro
atingiu o valor mais alto de sempre (11,1%), com mais um milhão e oitocentos
mil de desempregados no passado ano e os valores do desemprego juvenil, com
realce para a Espanha e para a Grécia, projetam-se para além dos 50%. Associar
a superação destes valores à retórica das reformas estruturais foi chão que deu
uvas: o problema de procura existe e não é pequeno.
Por cá, a progressão das falências/insolvências mostra a
dura realidade da destruição produtiva, mas também o empobrecimento individual
e familiar, bem visível no disparar das insolvências individuais.
E, last but not the
least, vai-se confirmando que o Reino Unido enfrenta uma das mais lentas recuperações
da sua história e, pasme-se, não ainda com perda assinalável do seu produto
(queda de 0,3% no 1º trimestre de 2012) devido ao comportamento da despesa
pública que, por mais tímida que se apresente, ainda constitui o único fator
que contrabalança a incerteza reinante. O caso do Reino Unido evidencia bem
que, aparentemente a salvo da trapalhada do euro, o mito da disciplina fiscal
não passa disso. Só espero que o eleitorado britânico penalize o custo
desnecessário desta lenta recuperação.
Com estas evidências todas convergentes, a prática de
terapias como a em curso em Portugal (por mais pacientes que sejam os
pacientes), com o pressuposto de que tudo vai bem no plano global, ficará na
história económica recente como um dos produtos mais gritantes da imbecilidade
doutrinária, quer esta fale alemão ou o mais puro “british”.
Sem comentários:
Enviar um comentário