As vozes a pugnar por uma forte depreciação do euro face
ao dólar como solução de transição para a asfixia que começa a paralisar a zona
euro não são muitas, nem as poucas que se fazem ouvir são particularmente
convincentes.
Mas à medida que o euro se aproxima de um valor que os analistas
têm considerado um “milestone” no processo de depreciação, 1.20 dólares, há
quem avance porque não uma depreciação mais forte e uma evolução tendencial
para a paridade 1 euro – 1 dólar.
É esse o caso de Martin Feldstein no FT de hoje e
Feldstein já não é uma voz qualquer.
Numa primeira análise, há alguma contradição entre a
depreciação contínua do euro e a pretensão de alguns em não abdicar de
continuar a projetar o seu futuro como moeda de reserva internacional,
substituindo-se ao dólar. Mas esse projeto poderá estar irremediavelmente
comprometido com as sucessivas indeterminações que pesam sobre a zona euro,
minando a sua estabilidade como projeto. Como temos vindo a defender em
sucessivos posts, o projeto é uma espécie de arquitetura que, face à queda de
um elemento que seja, entrará muito provavelmente em ruína.
Feldstein defende a ainda mais forte depreciação como
forma de incremento de rendimento e emprego suscetíveis de facilitar a
consolidação fiscal, gerando um boom de exportações. Tenderia ainda a estimular
o crescimento de salários e preços na Alemanha, contribuindo por essa via para
algum reequilíbrio norte-sul no interior da própria zona euro. Mas, no contexto
atual de crescimento do comércio mundial, um boom de exportações será sempre concretizado
à custa de alguém. Feldstein desvaloriza o impacto que tal processo poderia ter
nos Estados Unidos e na penalização das suas exportações para a Europa. Não
estaria tão certo dessa aparente neutralidade da situação americana, atendendo
sobretudo ao momento político americano e às ideias de Obama sobre a
reindustrialização da América.
O problema é que o potencial exportador da zona euro
continua a ser fortemente orientado para a própria zona euro, não sendo nessa proporção
estimulado pela depreciação do euro. Os ganhos estariam fundamentalmente na
relação “zona euro-economias emergentes”, favorecendo por exemplo o esforço de diversificação
das exportações portuguesas na procura bem sucedida de mercados emergentes. A
reação das autoridades chinesas face à pretendida alteração das relações de
paridade euro-dólar constituiria sempre um aspeto chave da sua exequibilidade.
Talvez por simples coincidência ou não, nos últimos dias
confrontei-me com algumas avaliações prospetivas do papel futuro (a 20 ou 30
anos) de moedas como o real brasileiro em termos de moedas de referência
internacional. Isso mostra que a batalha das moedas será intensa.
A tese de Feldstein exigiria uma complexa negociação e
coordenação de posições ao nível do G20 que a experiência mais recente permite
considerar como simples “wishful thinking”. Talvez possa ser encarada como um
simples paliativo ou algum reforço de oxigénio para ganhar tempo. Mas para
produzir efeitos exigiria alguma duração e para tal a coordenação económica
mundial não vive os seus melhores dias.
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