domingo, 1 de julho de 2012

CRISE E FERTILIDADE


 (The Economist)
O Economist desta semana dedica um artigo a um impacto menos badalado da atual crise económica a que, já por mais de uma vez, dediquei alguma atenção neste blogue – o impacto da crise sobre a fertilidade, mais propriamente sobre a taxa de fertilidade, número médio de filhos por mulher em idade ativa de procriação.
O gráfico que abre este post é muito ilustrativo do que está a ser observado a partir de 2008. Depois de um período de recuperação da taxa de fertilidade em alguns países, eis que com o impacto da crise económica internacional e europeia em particular e pelo efeito da indeterminação de futuro que pesa sobre todos nós essa recuperação se encontra bloqueada. O artigo diferencia bem os dois processos que podem estar subjacentes à nova queda da taxa de fertilidade: a decisão de reduzir efetivamente o número de filhos por casal ou, pelo contrário, de diferir no tempo a data de nascimento do primeiro filho. Investigação recente evidencia que é provavelmente o segundo efeito que está a acontecer nas economias europeias, o que pode anunciar ser o recuo atual da taxa de fertilidade meramente temporário.
Estamos perante um fenómeno transversal a toda a União Europeia e francamente grave nos países de Leste e da Europa central. Mas o aparente estado de graça (sem qualquer analogia com uma interpretação divina da criatividade) dos países da Europa do sul esgotou-se há muito e mesmo em Portugal estamos perante uma das mais baixas taxas de fertilidade do mundo.
Não é difícil antever as consequências estruturais de um fenómeno deste tipo: queda acentuada do produto potencial das economias, insustentabilidade do sistema de proteção social, maximização do problema do envelhecimento e forte dependência da energia demográfica da intensidade dos fenómenos de migrações, sobretudo do afluxo à Europa de populações com taxas de fertilidade culturalmente muito mais elevadas.
A dimensão económica da fertilidade nunca foi tomada a sério em Portugal, sobretudo se a pensarmos como impactando o segundo ou o terceiro filho. Recordo-me de, no Governo de Cavaco Silva, quando lecionava estas matérias em teorias e políticas do desenvolvimento, ter sido constituído um grupo de trabalho em que constavam cientistas de vários domínios (psicologia, várias especialidades de medicina, sociologia), mas em que nenhum economista era considerado necessário. Pura tontice, falso pudor, puritanismo serôdio, não compreendendo o peso da indeterminação. Aliás a relação inversa hoje existente entre a magnitude da taxa de desemprego e a idade em que se assume o casamento e/ou a vida em comum é por demais conhecida.
A opinião pública parece reagir mais ao catastrofismo de algumas projeções como aquela que consta do gráfico abaixo, que nos indica a data em desapareceria a última mulher e com ela a reprodução de algumas sociedades.
Mas o problema é bem mais relevante do que a visão catastrofista nos anuncia e constitui uma dimensão inequívoca dos custos sociais do desemprego e da indeterminação atual.

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