quarta-feira, 3 de julho de 2013

A ODISSEIA DE HIRSCHMAN


Já encomendei o livro, mas deixo para o António Figueiredo a sua próxima consulta detalhada e a subsequente recensão – porque “o seu a seu dono” e há que ter o sentido das hierarquias. Faço menção à recém-publicada biografia de um dos patronos deste blogue, Albert O. Hirschman, por um historiador de Princeton, Jeremy Adelman (capa acima).

Limito-me, pois, a chamar a atenção para o facto através da referência a um artigo de José Serra na “Veja”, que intitulou “Navegando contra o vento”. Onde se pode ler, designadamente: “Hirschman conseguiu ser adoravelmente cético sobre as virtudes de cada homem – não me parece que tenha chegado, em algum momento, a acreditar numa essência humana benigna –, mas era um otimista quanto às possibilidades de agir para melhorar a vida das pessoas. Entendia que a história tem condicionantes e que os eventos não se dão no vazio, mas não se surpreendia com as extravagâncias. Heterodoxo, em larga medida, é o mundo. Complexas são a sociedade e a natureza humana.”

(César Mascarenhas, http://www.toonpool.com)

Um elemento curioso do texto de Serra decorre do modo como começa e termina, recuperando e fazendo apelo a uma foto publicada pelo “New York Times” em 1945 (ver abaixo) onde um jovem judeu (Hirschman), fardado com o uniforme do exército americano, aparece ao lado de um general alemão a quem serviu de intérprete e a quem comunicou a condenação à morte pela justiça militar por implicação em assassinatos praticados durante a ocupação nazi do território italiano. O último parágrafo diz assim: “Muitas vezes fiquei a observar a foto em que Hirschman aparece ao lado daquele general nazista que representava as forças contra as quais ele lutou a vida inteira: a violência, o obscurantismo, a ignorância e o fanatismo. Terminada a guerra, conhecia de muito perto todo o bem e todo o mal de que são capazes os homens de ação. Sabia, sim, que era necessário mudar o mundo. Mas a obra que deixa nos diz também que é preciso pensar o mundo. Hirschman tirou o uniforme para ser um soldado da clareza, do não dogmatismo e da esperança.”

Mas o trabalho de José Serra é, sobretudo, um documento notável, bem demonstrador de como tende crescentemente a colocar a sua superior qualidade intelectual ao serviço dos fantasmas (?) de um político improvável. Após sublinhar que “Hirschman, ao pensar, não prestava tributos a altares de nenhuma ortodoxia” e que o mesmo avançou “mais do que ninguém no campo rarefeito de uma ciência social unificada”, escolhe uma palavra para se aproximar da sua obra (“possibilismo”) e assim permitir que se contraponha à política como “arte do possível” a política como “arte de ampliar os limites conhecidos do possível”. E junta: “Ao indivíduo cabe somar conhecimento e obstinação – é a Virtù. E o bom leitor de Maquiavel sabia que também existem os fatores imponderáveis da sorte, a Fortuna.” Ou, mais à frente, que “a liderança política é que faz a diferença”

Por aqui me fico. A palavra a ti, António…

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