Imagino-me um cidadão médio,
com informação política amalgamada pelas imagens e ruído da televisão. Demissão de Gaspar, de Portas e agitação associada. E
imagino a vertigem de desorientação que lhe passa pela cabeça, metralhado pela
sucessão também vertiginosa de demissões, incidentes, mentiras assumidas e
outras nem por isso, sessões grotescas de tomada de posse, autismo político,
precipitações, jogos de sombras, manobras palacianas, arremedos de táticas de
RGA (como referia Pedro Adão e Silva na SIC Notícias). Vertigem de desorientação
agravada pela reiterada pressão dos mercados (Martim Avillez até se deu ao luxo
de trocar SMS enquanto decorria o programa da SIC Notícias com supostos amigos
gestores de fundos de investimento), acenando com o caos da subida das taxas e
da libertação apressada de títulos da dívida pública portuguesa.
Para um cidadão com estas
características, a decisão de Passos Coelho de não se demitir oscilará ao longo
de uma muito ténue linha de demarcação entre o mais puro autismo e
irracionalidade e o ato de resistência a abandonar o barco.
Como alguém próximo me dizia
em jeito de desabafo perante tal desconchavo não deveriam ser apenas eleições
autárquicas em 29 de setembro, mas também legislativas e presidenciais,
correndo com todo este desconchavo de inexperientes obstinados e de incapazes convencidos.
O facto de no Parlamento o número
de deputados à esquerda (PS, PCP e Bloco) ser inferior ao número de deputados
do PSD pode prolongar toda esta longa agonia de desmoronamento progressivo. Basta
o CDS armar-se em agente passivo e abster-se sistematicamente, com exceção de
matérias em que queira marcar posição, o que não anuncia coisa boa, mas antes o
penoso e mal cheiroso apodrecimento da situação política.
Terá sido impressão minha,
ou António José Seguro estava profundamente ticoso (indicador de nervoso
miudinho) na sua mensagem ao país de reiterada aposta em eleições já? A
vertigem dos acontecimentos é madrasta para o projeto do PS de regresso ao
poder. Na voracidade da informação que cavalgava os comentadores e não o contrário,
o momento do PS passou praticamente despercebido. Trágico, talvez injusto, mas
avassalador.
Por ironia do destino
profissional, amanhã terei que estar no mítico salão do ministério das
Finanças, no Terreiro do Paço, a discutir conclusões de um estudo de avaliação
sobre instrumentos de política pública de apoio à inovação e internacionalização
no âmbito do QREN e, pasme-se, a propor recomendações para o próximo período de
programação. Estabilidade do universo da política pública ou pura adivinhação?
Desejaria que fosse a primeira e não a segunda. Mas não tenho a certeza que
assim seja.
Tirem-me deste filme, por
favor!
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