quarta-feira, 31 de julho de 2013

UM OUTRO ALGARVE

(Tavira - João Pedro Marnoto para o New York Times)


“Um outro Algarve ou o paradoxo dos nichos de mercado turístico” poderia ser um título alternativo para esta crónica. Agora, que por motivos de trabalho profissional, me vou ocupar dos destinos da região algarvia, vistos a partir da perspetiva dos municípios, entrou no perímetro da minha atenção uma excelente crónica do jornalista Seth Sherwood no New York Times sobre um Algarve mais recôndito, mais recatado e menos explorado.
O artigo de Sherwood lança-nos simultaneamente na nossa memória, recordando o Algarve inóspito que ainda chegámos afetivamente a viver há três décadas e na dinâmica de novos empreendimentos que procuram recuperar essa outra faceta não explorada e que o tempo ainda não consumiu. Alguns estrangeiros foram os primeiros a descobrir essa outra dimensão da Região e começa finalmente a perceber-se que o cálculo económico privado começa a querer explorar essa outra forma de a viver. A visita quase simultânea de Cameron e família coloca por coincidência a Região nos jornais de Londres e Nova Iorque, embora a dicotomia dos dois Algarves continue viva, com o Algarve mais consumido pelo tempo a ter de enfrentar o risco da degradação de infraestruturas ditadas pela concentração turística e pela retirada dos principais operadores imobiliários que sentem que o filão se esgotou.
Mas o paradoxo do nicho existe. Nos ecos do artigo do New York Times que passaram pelas televisões portuguesas, quase todos os entrevistados, estrangeiros e nacionais, referiram as vantagens da não balbúrdia, a diferença de usufruir de um espaço e de um território com pouca gente. Bom será assim. Mas a proliferação de artigos como o do New York Times, se produzir os efeitos desejados, tenderá a trazer mais gente, não necessariamente aos lugares de procura mais densa, mas precisamente aos lugares em que o tempo pode ser usufruído. E a pergunta inevitável é a seguinte: terão esses lugares mais inexplorados a capacidade de acolher essa procura adicional sem perder o seu traço diferenciador? A questão é estratégica e ou o valor por turista acolhido terá de aumentar significativamente, ou então esse outro Algarve vai ter de encontrar a sua engenharia de oferta para não perder a sua inimitabilidade.
Mas se a resolução desse problema contribuirá para uma diversificação crucial da oferta turística, o outro problema tem de ser também resolvido. E, no contexto em que a Região se encontra, a responsabilidade de conter a degradação das infraestruturas ditada pela usura do tempo e pela sobreocupação sazonal recai nos Municípios, pois todos os outros saíram da responsabilidade e deixaram a porta aberta.

Sem comentários:

Enviar um comentário