terça-feira, 30 de julho de 2013

AS ILUSÕES DAS NARRATIVAS (II)



Podia ter-me dado para melhor, mas aguentei mais de duas horas a acompanhar a audição da ministra Maria Luís Albuquerque (MLA), no âmbito da sua segunda ida à comissão de inquérito do complicadíssimo caso dos SWAP. E, deliberadamente, estou a registar as minhas impressões sem ouvir a catadupa de comentadores ou arremedos de tal que hoje povoarão seguramente os diferentes canais de notícias.
A posição da ministra é algo frágil, sobretudo quando se compara a intervenção mais estruturada e preparada de hoje com o seu testemunho de 25 de junho. A aposta de toda a oposição, incluindo a do PS, centrada na questão de saber se mentiu ou não mentiu ou como hoje em certos momentos da audição chegou a dizer-se se ocultou ou não em 25 de junho elementos relevantes, corre o risco a meu ver de não produzir resultados visíveis para o cidadão sensível ao debate político e de abrir a guarda sobre outros aspetos, dos quais a maioria pode tirar amplo proveito.
Entendamo-nos. A intervenção de hoje de MLA, que me impressionou favoravelmente pela consistência e determinação da preparação, só perturbada nos momentos de maior exploração do confronto entre as suas duas intervenções na Comissão de Inquérito, é no meu entender uma tentativa de corrigir as debilidades do seu primeiro testemunho. É-o, objetivamente, mesmo que MLA nunca o vá admitir. Com esta emenda, é difícil saber se a ministra ficou mais ou menos frágil. Arriscaria a dizer que, do ponto de vista político e da interpretação que o cidadão eleitor fará desta audição, a ministra ficou menos frágil.
Mas, para um ouvinte tecnicamente leigo em matéria de engenharia financeira de SWAP, a audição abriu significativamente a guarda do PS nesta matéria. Sem o pretender demonstrar como seu primeiro objetivo, a intervenção da ministra foi inteligentemente abrindo informação que coloca a posição do PS nesta matéria, por muito que custe ao ex-ministro Teixeira dos Santos, numa situação de grande fragilidade. E até pode especular-se se a agressividade com que o Zorrinho pediu a demissão da ministra não seria uma tentativa de criação de uma cortina de fumo sobre as lacunas da supervisão do ministério das Finanças do governo Sócrates sobre esta matéria. Pois, de facto, a supervisão ligeira da atuação das empresas públicas neste domínio, das que se sabia que iriam entrar no perímetro do Orçamento de Estado e, por isso, das metas do défice e da dívida e sobretudo a não dotação do IGCP de competências para assegurar essa supervisão a priori, pode ser apontada como uma supervisão pouco convincente. O argumento de MLA de que a Direção Geral do Tesouro e Finanças (DGTF) não reunia as competências técnicas necessárias para supervisionar a complexidade destes contratos de gestão de risco é um argumento muito forte, criticando assim o último despacho do ex-secretário de Estado Costa Pina. Já não vou entrar nas acusações que MLA faz da inação do ex-DGTF. Mas o que fica das duas horas de audição em que heroicamente descansava de um dia de trabalho é a fragilidade do controlo sobre este problema a cargo do governo anterior. E se cruzarmos essa posição com a de outros amores do governo Sócrates por outras formas do “new public management” à portuguesa como as parcerias público-privadas então, ou me engano muito, ou o PS vai demorar algum tempo a fazer esquecer essa guarda aberta e desprotegida da sua governação.
Em meu entender, a situação não é ainda tão visível porque PCP e BE ferraram o osso da fragilidade política da ministra e dificilmente o vão largar. Mas se isso acontecer, virando-se para a fragilidade do PS, então este poderá estar em apuros. Até porque Seguro continua em descida de expectativas refugiando-se na abstração de uma luta e de uma retórica política puramente formal, como o debate da moção de confiança hoje o evidenciou.
Mas, para além de saber quem é que tem a guarda mais desprotegida, o que fica claro de todo este imbróglio é a grande fragilidade do Estado em todo este processo face à sofisticação do produto e ao poderio da outra parte. E esse dá que pensar, sobretudo quando está por demonstrar a sagacidade e consistência técnica de quem negociou tais produtos por parte das empresas públicas. Esse sim é o grande problema.

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