sexta-feira, 5 de julho de 2013

PENSANDO NO TURBILHÃO



O meu colega Freire de Sousa já aqui realizou um importante contributo de ir além da poeira que este turbilhão político tem levantado. Manter, nos tempos que correm, a sanidade de espírito exige de facto essa tarefa de perscrutar na poeira algumas regularidades que nos ajudem a antever saídas, definir posicionamentos críticos, agitar ideias quando necessário, combater soluções para as quais há crónica anunciada de fracasso.
O meu modesto contributo para esta matéria limita-se à identificação de algumas preocupações que decorrem da minha leitura do turbilhão atual.
Primeiro, a perceção de que o turbilhão observado estava anunciado. A surpresa vivida não respeita ao facto em si, mas tão só ao momento em que ele se produziu. Sabíamos que ele iria acontecer mais tarde ou mais cedo. As razões para pensarmos assim começaram a ser melhor conhecidas a partir do episódio da TSU. A sobranceria como Coelho e Gaspar e o seu círculo mais restrito concebiam a relação entre a economia e as dimensões do político e do social só poderiam conduzir a resultados desta natureza. Tal sobranceria combinada com o catavento Portas disfarçado de sentido de estado tornar-se-ia explosiva a todo o momento. Crónica anunciada que o senhor de Boliqueime deveria ter sido capaz de antecipar, porque, conceda-se-lhe o benefício, não enferma da mesma sobranceria, nem é propriamente catavento. Tem outras incapacidades, mas não estas.
Segundo, uma perceção incómoda de que a invocação dos mercados tem sido utilizada como um fator de extrema perversidade, perigosa para a sustentabilidade da democracia, acolhendo a estafada ideia de que os mercados não aguentariam eleições antecipadas, ou a ainda mais perversa ideia que vagueia ocultamente em algumas cabeças de que o custo das eleições (antecipadas ou não) é incomportável para um país nestas circunstâncias. Estas derivas são inaceitáveis, perigosas, e tendem a despertar mentalidades que deveriam estar pura e simplesmente erradicadas. Há dias, quando procurava refrescar-me ao fim da tarde em casa, vendo num sofá com corrente de ar a SIC Notícias, dei com um programa com o Pedro Adão e Silva e o Martim Avillez. Perante o meu espanto, este último depois de trocar algumas mensagens de telemóvel, afirmava depois que amigos diretores de diferentes fundos de investimento estariam a vender massivamente títulos da dívida pública portuguesa, precipitando a tal reação dos mercados face ao eclodir da crise política. Em tempo real, contribuindo para que a opinião pública que ouvia o programa autorreduzisse mentalmente a sua própria perceção das alternativas. Preocupante. Diria mesmo assustador.
Terceira perceção, a ideia da situação de acantonamento muito difícil em que o PS está progressivamente a mergulhar, à medida que o ritmo cardíaco de António José Seguro (AJS) aumenta (precipitação de eleições) ou diminui (aparente estabilidade governativa). Ontem, quando AJS clamava ao país (e talvez falando para os mercados) que tudo faria para que a agonia do governo não se transformasse em agonia do país, discurso louvável e apaziguador de uma sociedade portuguesa cada vez mais insegura e propensa a mensagens pacificadoras, por mais paradoxal que isso possa parecer, AJS estava a aumentar as indeterminações que ainda pesam sobre a consistência da alternativa PS para ultrapassar esta instabilidade. De facto, a velocidade a que a situação está a degradar-se justifica que o PS não se reserve apenas para o seu programa eleitoral. É necessário que a consistência da alternativa seja demonstrada coerente e progressivamente à medida que a evolução da situação nos interpela. Muito simplesmente, ponto por ponto, o que é que o PS tem para nos oferecer como alternativa ou réplica a cada um dos vetores de intervenção da presente e alquebrada maioria de governação.
Quanto mais rapidamente o PS decidir abrir o jogo e comprometer-se menos provável será que a tese dos custos das eleições antecipadas se sobreponha à racionalidade de aceder a novas escolhas. Está difícil o PS compreender esta equação e decidir propor a sua resolução. Quanto mais adiar essa demonstração, mais se cava no cidadão médio a interrogação se a alternativa existe.

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