quarta-feira, 3 de julho de 2013

HIRSCHMAN, O IMPOSSÍVEL NÃO EXISTE



A monumental biografia de Hirschman de Jeremy Adelman (Worldly Philosopher) assinalada pelo meu colega de blogue Freire de Sousa tem sido fonte da minha contínua frustração de não conseguir nos últimos tempos a libertação de tempo do trabalho profissional para me dedicar aquilo que gosto verdadeiramente de fazer, tatear a investigação, trabalhar a economia política que vale a pena integrar nas nossas ferramentas para compreender o mundo de hoje.
Tenho evoluído lentamente nessa monumental biografia e por isso uma recensão mais profunda e interpeladora dos tempos de hoje tem ficado para tempos mais próximos, esperando que as férias que se aproximam me concedam uns dias de paz e de garantia de leitura mais pensada e trabalhada.
Por coincidência, na semana passada, no meu contacto com Rosa d’Aguiar Furtado na apresentação dos ensaios de Celso Furtado sobre cultura em Serralves, em fim de tarde pouco concorrido para a importância do evento, falámos da aproximação entre Celso Furtado e Albert O. Hirschman, demonstrada por uma série de cartas entre os dois economistas que constam do arquivo que o Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento está a organizar. Les bons esprits se rencontrent toujours. Talvez José Serra, outra companhia das minhas primeiras incursões sobre este tema, o tenha compreendido. Como não podia deixar de o ser atendendo à matriz inquieta que os dois economistas partilhavam, mesmo que os conduzindo a investigações diversas.
Dizia nessa simpática reunião o Artur Castro Neves com a sua inquestionável finura de espírito que o tema do futuro será o desenvolvimento, pois tudo está questionado, todos os modelos de desenvolvimento estão em discussão, o desenvolvimento deixou de ser o “escândalo” de que falava Jacques Austruy para se transformar na questão central de todas as sociedades incluindo as rotuladas de desenvolvidas. A minha vida académica deveria estar a começar.
Aos tempos de hoje e sobretudo aos nossos neste retângulo sem rumo, interessa muito a perspetiva à la Hirschman de que no aparentemente impossível há sempre um possível, há sempre uma combinação de recursos e uma trajetória aparentemente pouco ortodoxas que podem conduzir a soluções sustentáveis, saiba-se tirar delas o melhor potencial. Há tempos, na sua morte, o The Economist falava da "dismal science" que os seus Essays on Trespassing tão bem representavam.
É nestes tempos de invenção de novas combinações de recursos que menos lixo intelectual deve ser consumido e concedida a prioridade das prioridades a rever os que nos interpelam, porque sempre se interpelaram nas mais diversificadas situações e experiências de trabalho e de vida.
P.S.
Hoje no salão nobre do ministério das Finanças não me apercebi que vagueassem fantasmas ou almas penadas. Uma comunidade de práticas em torno dos temas da inovação e internacionalização discutiu abertamente resultados de instrumentos de política pública sem que o desconchavo político perturbasse a discussão. Como dizia o meu amigo e antigo colega de docência Mário Rui Silva, será daquela comunidade de práticas que ali estava que provavelmente dependerá o futuro da programação 2014-2020 nestas matérias. O desconchavo é tão grande que as forças liderantes nem sequer se apercebem da matéria-prima disponível e do capital de aprendizagem que o sistema de políticas públicas de inovação e internacionalização tem vindo a acumular.

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