quinta-feira, 25 de junho de 2015

A TRAGÉDIA TORNADA FARSA

(Kipper Williams, http://www.guardian.co.uk)

Já não há pachorra! A maioria desta gente que governativamente (?) nos cerca não é mesmo confiável. Ou melhor, talvez até seja confiável, mas só o é para efeitos de assegurar a qualidade e o tipo de serviço que presta a quem verdadeiramente manda no mundo. Explico-me: aquilo a que estamos a assistir no presente caso “Grécia contra credores” ilustra à saciedade os reais limites com que no essencial esbarram todas as crendeiras tentativas de humanizar negocialmente a lógica do sistema, leia-se, de o reformar substantivamente por dentro.

Mas não, não penso que decorra daqui que as alternativas sejam as de uma pura e simples capitulação/rendição ou de resolver o assunto violentamente ou à bomba, apenas que importa produzir esforços sérios e titânicos no sentido de ir mais fundo e de ser mais criador na abordagem dos problemas e de estender/alargar a procura de soluções a mais e mais formas de expressão e participação dos cidadãos – só o conhecimento e a democracia poderão vergar, e nunca em definitivo, as dominadoras manifestações dos incorrigíveis vícios do género humano e das construções sociais que dele emanam nos horizontes temporais que estão ao nosso alcance.

Filosofias à parte, o que temos agora? Em concreto, temos que há dois dias os representantes dos credores (i.e., os ministros europeus das Finanças reunidos em Eurogrupo) declaravam, entre satisfeitos e vitoriosos, que a lista detalhada de reformas enviada pelo governo grego no último domingo era positiva e abria claras perspetivas a um acordo; e temos que ontem, esses mesmos seres suspenderam a sua reunião, que se esperava conclusiva, afirmando que o plano grego assentava demasiado em aumentos de impostos e não garantia assim certezas fortes a nível de resultados a obter em termos de consolidação orçamental; e temos mais coisas, que de momento vêm menos ao caso, como o vergonhoso comportamento de Lagarde – vale tudo em defesa de interesses próprios? –, a voz de comando do ressabiado mandante Schäuble, o papel de cães-de-guarda dos “socialistas” Dijsselbloem e Gabriel (entre outros mais comedidos, como Moscovici e Sapin, p.e.) e a figura de idiota útil de Juncker e dos principais comissionistas envolvidos (assim como de Tusk). Vejamos o que dá a tarde de hoje...


(Maragos Panos, http://cartoonists.gr)

(Joep Bertrams, http://www.vn.nl)

(ilustração de Kipper Williams, http://www.guardian.co.uk)

Entretanto, e no meio de toda esta indecência, vai havendo gente que pensa e sempre mantém os pontos cardeais no certo e devido sítio. Como o “velho” Jürgen Habermas, que veio novamente denunciar “a escandalosa política grega da Europa” numa tradução de um texto recente ontem publicada no “Le Monde” e onde refere que a crise da Zona Euro é centralmente uma crise das elites políticas nacionais escondidas atrás dos seus próprios eleitores e geradora de um perigoso “coma pós-democrático”. Não sem criticar de passagem, mas assertivamente, o governo do Syriza, acantonado num moralizador blame game, numa justa mas insuficiente reivindicação de reestruturação da dívida e numa representação algo etnocêntrica da solidariedade.

 (ilustração de Antoine Moreau-Dusault, http://lemonde.fr)

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