(Um, dois,
três figurões)
O Financial Times (FT), embora não ocultando a sua natureza de jornal
liberal e profundamente identificado com a glorificação do mercado, tem mantido
em relação ao problema da Grécia uma atitude de abertura a todas as perspetivas
sobre o fio de navalha em que o assunto se transformou.
Mas ao abrigo da chamada “op-ed page”,
o FT tem acolhido nas suas páginas de opinião as posições mais inflexíveis e
economicamente menos fundamentadas sobre a tragédia do euro. É esse o caso do
economista alemão Hans-Werner Sinn responsável pela intoxicação da opinião pública
alemã sobre os riscos dos desequilíbrios entre os países do norte e do sul na
zona euro e um dos grandes responsáveis pela rejeição do princípio da
mutualização da dívida. É também o caso de Niall Ferguson que tem conduzido a pretensa
argumentação de que a vitória dos conservadores no Reino Unido teria
representado a derrota póstuma de Keynes.
(O figurão Francesco Giavazzi)
A estes figurões juntou-se mais recentemente, Francesco Giavazzi (Bocconi
University, Milão) com um contundente artigo sobre a Grécia, provocatoriamente
intitulado de que “Os Gregos escolheram a pobreza, deixemos segui-los o seu caminho”. O artigo é uma peça eminentemente política, procurando conceder o
aval da academia aos falcões europeus que jogam ou no afastamento da Grécia ou
na sua submissão pura e simples.
Karl Whelan, economista irlandês dedica-lhe no Bull Market de 10 de junho
uma desconstrução rigorosa das provocações de Giavazzi. Vale a pena sublinhar
algumas dessas faltas de rigor desmontadas por Whelan.
A primeira consiste na desvalorização que Giavazzi faz das reformas que o
setor público grego terá realizado. A verdade dos números divulgados pela
Comissão Europeia anuncia que o emprego público grego foi reduzido de 907.351
indivíduos em 2009 para 651.717 em 2014, uma redução “ligeira” de 25%, cerca de
255.000 dispensas ou abandonos. Pequeno ajustamento? Não parece. E a passagem
do Syriza pelo poder representou apenas a entrada de mais 15.000 funcionários,
o que reportado aos 255.000 acima sublinhados é uma gota de água.
Giovazzi é um dos tais figurões que, conjuntamente com Alesina (Harvard)
sempre defendeu que a austeridade era expansionista. Por isso, no seu artigo de
opinião desvalorizou o esforço de redução do défice público grego. Puro
descaramento. A Grécia reduziu o seu défice público de 15,6% do PIB em 2009
para 2,5% em 2014 e desafiam-se os mais temerários a encontrar uma redução de défice
público tão violenta por esse mundo.
Mas não contente com tamanha falta de rigor, vem o argumento de que a Grécia
é insensível às reformas necessárias. Whelan encontra um indicador
interessante. No Doing Business Report
de 2010 a Grécia estava no 109º lugar. Em 2015, o mesmo relatório apontava para
a 61ª posição. Pura magia dos rankings? Os Gregos terão corrompido o Banco
Mundial? Whelan mostra ainda que a Grécia foi a economia que realizou a mais
significativa reforma no sistema de pensões, pelo que a negociação em curso de
obrigar os gregos a um corte de pensões é pura chantagem.
A academia mediática está cheia de figurões deste calibre.
Poderei sem dificuldade transportar para a denúncia da postura destes figurões
a recente reflexão de Bradford DeLong sobre as acusações que no debate
americano são realizadas aos keynesianos:
“Devo dizer que para mim se está a tornar cada vez mais claro o que é
que está em causa quando um Robert Lucas diz que Christina Romer só é a favor de
uma política fiscal expansionista porque isso corresponde à vontade dos seus
patrões ou quando Russ Roberts diz que Paul Krugman é a favor de uma política
fiscal expansionista porque é um socialista adepto de um grande governo. O que
acontece é que estão a olhar-se ao espelho. O que estão a fazer é simplesmente
a projetar-se. Pendam que temos a sua moral e os seus processos de pensamento e
que somos tão ideologicamente cegos, partidários leais ou de vistas curtas como
eles o são. Mas não
somos como eles. Somos por um governo que funcione, não um por
um setor público pesado pelo simples facto de existir; intervenção pública onde
seja necessária; as circunstâncias alteram os casos. Somos por uma esfera pública
informada, não por uma que pense que um governo mais pesado e mais ativo é
necessariamente melhor: queremos eleitores que compreendam os aspetos positivos
e negativos do apoio tecnocrático a políticos que o reconheçam.”
Como eu compreendo Bradford DeLong. O ambiente está a ficar irrespirável.
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