(Reflexões
em torno do artigo de José Pacheco Pereira “A Europa que nos envergonha” e dos últimos
desenvolvimentos da tragifarsa grega)
José Pacheco Pereira (JPP) tem hoje no Público um artigo que, além de ser
um verdadeiro libelo acusatório contra o estado de coisas em que a União
Europeia mergulhou, constitui em meu entender um documento crucial de reflexão
para todo o democrata que, qualquer que seja o país de origem, alinhou com as esperanças
de um projeto europeu suscetível de aprofundar a democracia europeia.
Na perspetiva de JPP, o modelo económico e financeiro que subjaz ao pensamento
dominante resulta de uma estranha aliança política: “ …o mal
estar que existe na Europa é uma pedra no orgulhoso caminho imperial do Partido
Popular Europeu, partido de Merkel, Passos e Rajoy e nos socialistas
colaboracionistas que são quase todos que os acolitam. É isto a que hoje se
chama ‘Europa´”.
A relação de forças que está criada pela proximidade, conivência e
cumplicidade entre o pensamento alemão que domina o PPE e o meloso pensamento
socialista e social-democrata que desde a Terceira Via de Blair e a descoberta
do New Public Management está
instalado entre os partidos socialistas e sociais-democratas europeus, tão bem
representada nas franjinhas encaracoladas do Presidente do Eurogrupo, candidato
a novo mandato, corresponde a uma via de sentido único que compromete a
diversidade e a livre escolha democrática nos países que alinharam com a
construção europeia. Esta ordem das coisas começava a ser visível, mas a emergência
do SYRIZA e do modo como a sua chegada ao poder tornou tudo mais transparente. Tudo
isto acontece sem se concretizarem os processos de integração politica e de
harmonização fiscal que, a serem ratificados pelos Parlamentos nacionais,
constituiria então uma assumida transferência de poder dos países para as
instituições europeias cujo escrutínio democrático teria de ser muito mais
efetivo e operante do que o atualmente existente.
Custa-me escrever esta frase, mas a democracia está condicionada por esta
afirmação imperial de um modelo económico e financeiro para cujo contraditório existe
pensamento económico e político que baste para o tornar possível, mas cuja
manifestação de alternativa é bloqueada por um conjunto de compromissos a que
os socialistas e sociais-democratas europeus se vergaram.
JPP tem razão em denunciar que o que a imposição negocial dos credores,
acolitada pela posição não equidistante das autoridades comunitárias, significa
é uma rejeição não das propostas gregas mas sobretudo do resultado das últimas
eleições gregas. Como já o referi, fora outro o governo grego a protagonizar a
negociação, por exemplo liderado pelo partido do senhor Samaras ou até pelo
corpulento ministro das Finanças do governo do PASOK e outra seria a
flexibilidade negocial.
Não importa discutir se o SYRIZA estava ou não preparado para a batalha em
que se meteu, como também não importa aqui discutir o estilo negocial do próprio
Tsipras, sobretudo depois da ideia de referendar a proposta dos credores. Todos
estes aspetos serão válidos e não serei eu a defender o talento negocial de
Tsipras e da sua equipa. Mas não é isso que está em causa. O que está em causa é
que o modelo europeu evolui sem contraditório consistente e que as eleições
nacionais estão hoje condicionadas por esse facto. Estou com JPP quando ele afirma
sem papas na língua que: “O problema não é
o pagamento aos credores, não é “a violação das regras europeias”, (quais?), não
é uma esforçada dedicação pela “recuperação” da Grécia, é apenas e só político:
não há alternativa, não pode haver alternativa, ninguém permitirá “nesta Europa”
nenhuma alternativa que confronte o poder dos partidos do PPE e seus gnomos de
serviço socialista, porque isso fragiliza aquilo que para eles é a Europa.”
Gostei sobretudo dos “gnomos de serviço socialistas”. Gostaria que a
candidatura de António Costa estivesse mais a discutir este condicionamento e a
arrepiar caminho para o contrariar do que a discutir cenários macroeconómicos.
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