(Rena Effendi - New Yorker)
(Reflexões próprias de um curto intermezzo estival)
Reduzido tempo para reflexões blogueiras, pois o 8 ou o 15 de agosto e
respetivas vizinhanças em função das circunstâncias constituem daqueles raros
momentos em que a família se encontra em Seixas, naquelas encruzilhadas do
tempo em que cada casal parte ou chega para ou dos seus trajetos de férias e
que têm de ser aproveitadas gota a gota do tempo, saboreando como se de um néctar
precioso se tratasse.
O título do post não é como seria legítimo esperar inspirado pela saga dos
cartazes do PS, a qual evidencia um requentado falta de sentido de proporção
das coisas. Não lembraria ao diabo recuperar para a imagem da campanha a
inspiração (???) de alguém ligado a campanhas passadas, sobretudo num tempo em
que a alternativa socialista tem de ser construída com o futuro, ignorando o
mais possível o passado. E de facto desde o evangelismo do cartaz da confiança
até às figuras dos desempregados que, pelos vistos, não tinham sido avisados do
tipo de tratamento a dar ao seu rosto e experiência e que conduziu a um pedido
de desculpas, é confrangedora a falta de profissionalismo que dali pode ser
inferida. De facto, nada sai bem à campanha do PS e começa a temer-se o pior,
apesar da notoriedade e confiança que a personalidade de Costa inspira.
Mas o título confiança não provém dessa fonte de inspiração, antes de um
delicioso artigo da New Yorker sobre um tema
improvável, mas que devorei num trago num fim de tarde deste intermezzo estival
de fim-de-semana. A New Yorker é inconfundível
neste tipo de surpresas que nos agarram da primeira à última linha, quando
surge aquele sinalzinho gráfico preto que indica fim de artigo.
O artigo é assinado por Peter Hessler, insere-se na secção Letter from Egypt e designa-se espantem-se
de “Learning to Speak Lingerie – Chinese mercahnts and the
inroads of globalisation”.
Pois! Alguém se lembraria que o negócio florescente da lingerie no Egipto
fosse dominado por chineses? O artigo é um documento precioso para discutir e
ensinar a relevância da confiança no negócio comercial. Ou seja, a capacidade
comercial dos chineses que se implantaram na zona do Egipto em que a reportagem
é desenvolvida (a cidade de Asyut no Egipto superior) radica sobretudo na
confiança que conquistaram junto da população local, da mais importante à mais
popular, num produto que exige o maior dos cuidados para ser vendido (em massa
diga-se) numa sociedade em que a mulher tem dois universos para gerir: o mundo
da exposição pública e o mundo da intimidade longe dos olhares da curiosidade pública.
Imaginem uma loja ocidental que de repente é invadida por alguém muito
importante acompanhado de um conjunto diversificado de mulheres (ascendentes,
descendentes, mulheres, familiares) que, sob a sua sábia supervisão, vem
abastecer-se de produtos de lingerie. Não será difícil imaginar a velocidade a
que o imaginário ocidental presente na loja, de vendedores a outros clientes,
circularia, provavelmente gerando a desconfiança de tão insignes compradores. Ora,
o que a reportagem de Hessler nos consegue transmitir é a capacidade inata dos
chineses donos da loja em que decorreu a reportagem para assumir a comunicação
em torno de produto tão sugestivo, na mais completa e absoluta neutralidade,
sobre a qual é construída a relação de confiança, a ponto dessa confiança
possibilitar a presença do jornalista ocidental.
O mundo da confiança comercial é fascinante. É uma matéria sobre a qual
gostaria um dia de escrever longa e aprofundadamente. A New Yorker nunca deixará
de me surpreender. A leitura ideal para um curtíssimo intermezzo estival.
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