quinta-feira, 13 de agosto de 2015

THE FUTURE OF WORK

(Uma imagem de Detroit nos tempos em que era assumida a regra de que o aumento dos salários deveria igualar o crescimento da produtividade mais o aumento dos preços dos bens de consumo)



(Um debate recorrente, ou talvez não)

O título vai desta vez em inglês como forma de homenagem ao PACIFIC STANDARD que acolhe por estes tempos uma série de contributos de reflexão sobre um tema que me interessa francamente, o futuro do trabalho. O jornal promove um projeto de debate, no âmbito do qual empresários, líderes sindicais, cientistas sociais, tecnólogos visionários, ativistas e jornalistas discutem as alterações nas condições e no posto de trabalho que se antecipam como mais impactantes do nosso futuro.

O tema é crucial para refletir sobre o que o pensamento de esquerda e social-democrata poderá acrescentar a esta reflexão e sobretudo integrar as grandes tendências que se associam ao futuro do trabalho na sua própria reformulação, questão da qual tem andado muito arredado.

Para demonstrar que se trata de um debate de alto nível, posso acrescentar que despertei para a cobertura do Pacific Standard graças à chamada de atenção para o contributo de Robert Solow, Nobel de Economia graças ao seu modelo de crescimento neoclássico, uma das construções simultaneamente mais abstratas e apaixonantes que alguma vez a teoria do crescimento económico nos proporcionou. Solow está naquela veneranda tradição de conjugar rigor matemático e formal com uma capacidade imensa de refletir sobre as evidências sociais, resistindo à tão comum perversidade de inventar evidências para sustentar o formalismo económico.


O ponto de partida da reflexão já aqui foi comentado de vários ângulos e prende-se com o estatuto de farol que a economia americana tem vindo a revelar na desconformidade observada entre o crescimento da produtividade na economia americana e a variação dos salários. Solow relembra a boa prática histórica vivida na indústria automóvel americana de fazer depender a variação dos salários do crescimento da produtividade e do crescimento dos preços dos bens de consumo, norma que tendia a estabilizar a percentagem de valor acrescentado da indústria que afluía regularmente ao mundo do trabalho. Os números de Solow para a última década são inequívocos: 12,3% de crescimento da produtividade e 5,1% apenas para o crescimento dos salários, apesar de no último ano e meio a remuneração real ter superado ligeiramente o da produtividade.

Conhecedor de que esta desconformidade dinâmica pode ser explicada por diferentes fatores incluindo a própria natureza do progresso tecnológico, a polarização dos empregos e os rumos da globalização, Solow pretende apenas associar o prestígio do seu nome e da sua obra a dois outros fatores talvez menos suportados por defensores tão prestigiados. Fala, assim, em primeiro lugar do peso que pode ter neste fenómeno a não divisão equilibrada no interior das empresas de uma terceira componente para lá dos rendimentos do trabalho e do capital. Essa outra componente é representada pelas rendas que remuneram a posição particular de cada empresa, uma espécie de renda de monopólio, no fundo todas as condições que bloqueiam o funcionamento da concorrência e que impedem que parte do excedente criado na empresa possa beneficiar os preços de mercado e o consumidor em última instância. Ora o que Solow destaca é a queda abrupta do poder negocial do trabalho na negociação e na partilha dessa renda comum à empresa. E claramente relacionada com esta queda do poder negocial está o outro fator que Solow designa de “casualização” do trabalho, isto é, todas as formas de atipicidade na relação de trabalho, do trabalho a tempo parcial em unidades quase infinitesimais, do trabalho temporário e dos contratos a termo, quer estas tendências resultem de opções individuais, quer decorram (tendência mais forte) de uma forte tendência para a desregulação e perda de influência da contratação coletiva e do poder sindical na determinação da contratação individual.

Os processos de ajustamento gerados por bail-outs de bancos ou de países tiveram uma influência decisiva na “casualização” que Solow assinala, reforçando tendências em curso determinadas pela própria evolução do capitalismo. Por outras palavras, não foram processos neutrais, antes pelo contrário alteraram decisivamente, com consequências de período longo, os equilíbrios da relação entre o capital e o trabalho nas empresas e por isso se transformaram em parte interessada de uma dinâmica de desvalorização do trabalho.

Voltaremos ao Pacific Standard e ao futuro do trabalho.

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