O Labour Party britânico está em pleno processo eleitoral para a escolha do líder que substituirá Ed Miliband. Depois de diversos ensaios e ameaças, estão na liça quatro candidatos relativamente improváveis e até agora insuspeitos de grande carisma: duas mulheres, Yvette Cooper e Liz Kendall, e dois homens, Andy Burnham e Jeremy Corbyn. Mas o avanço deste nas sondagens parece sinalizar uma vitória provável do candidato mais velho (66 anos) e mais à esquerda de entre os quatro. E as reações e provocações internas a este eventual resultado não têm primado pela meiguice, com o inclassificável Tony Blair na dianteira a vaticinar a derrota do partido em caso de viragem à esquerda e a sugerir aos apoiantes de Corbyn um “transplante de coração”.
Desta escolha e das suas implicações imediatas sairão também contributos relevantes de resposta a duas outras questões cruciais por esclarecer: a da perturbadora falta de uma saída para a permanente e crescente encruzilhada social-democrata nas sociedades europeias mais avançadas, por um lado e mais genericamente, e a de um ainda possível lugar nesse quadro para um ideário político mais centrado em causas e princípios típicos da esquerda tradicional, por outro lado e mais especificamente. Com a agravante, no caso do Reino Unido, do fantasma daqueles dezoito anos de Thatcher e Major em que o Labour não apenas esteve afastado do poder como levou algumas tareias eleitorais (recordo os históricos 27,6% de 1983) sob a égide das direções reconhecidamente esquerdistas ou esquerdizantes (de Michael Foot, Neil Kinnock e John Smith) que a “Terceira Via” de Blair viria a derrotar internamente em 1994 e a validar nacionalmente em 1997.
Aquele “we can learn a great deal from Karl Marx” com que Corbyn enfrentou sem rebuço os seus detratores, bem assim como a explicitação que quis acrescentar – “É aplicável agora? Bem, obviamente que a filosofia se aplica em todos os tempos. Tomemo-lo então como um meio de garantir que a vida das pessoas adquire razoável segurança por via da propriedade pública dos maiores monopólios” –, falam por si. Em termos mais concretos, Corbyn sustenta que o Labour perdeu as últimas eleições por se ter colocado “demasiado próximo do big business” e “demasiado próximo da ortodoxia económica” e tem assim vindo a deixar claras as suas posições de defesa da renacionalização dos transportes ferroviários, de serviços de fornecimento de energia e água publicamente regulados, de novos impostos sobre a riqueza e o capital, de criação de um banco nacional de desenvolvimento e de uma baixa das propinas. Tudo isto no contexto de um Cameron que radicaliza à direita – mais liberalismo económico e mais securitização fronteiriça – e de um Reino Unido que vai referendar a sua presença na União Europeia no próximo ano. Um assunto a merecer seguimento cuidado...
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