(Todos devemos aprender com a riqueza e honestidade do
debate americano em matéria de ideias económicas. Krugman questionou a tese de
Ben Bernanke de que a disrupção violenta do sistema financeiro e dos mercados
de crédito tenha sido o elemento determinante da Grande Recessão, pedindo mais
informação sobre os mecanismos de propagação de tal impulso. A bem do debate Bernanke respondeu.)
Atento a
este debate, chamei a atenção em post
anterior sobre as implicações que ele veicula do ponto de vista de saber se
numa próxima recessão a economia americana e mundial em geral estão ou não em
condições para uma resposta mais rápida e tranquilizadora à mesma. Por outras
palavras, à questão “teremos ou não aprendido alguma coisa?” responderemos
diferenciadamente consoante seja a bolha imobiliária ou a disrupção violenta
dos mercados de crédito o determinante passado da Grande Recessão.
As dúvidas
de Krugman apontavam numa direção clara. Aparentemente, teria sido o
investimento em capital fixo residencial (comercial e de habitação das
famílias) a ser mais atingido no colapso de 2008, o que sugere o maior peso
explicativo da bolha imobiliária como fator determinante da Grande Recessão. À
posição de Bernanke que apontava para a disrupção violenta dos mercados de
crédito como o fator determinante, Krugman contrapunha a necessidade de
identificação dos mecanismos através dos quais o impulso do colapso do crédito
teria atuado.
Bernanke
replicou (link aqui) uns dias depois e como é usual nestas ocasiões o desenvolvimento do
debate vai permitindo aproximar argumentos e sobretudo fazer luz sobre o
problema. O que Bernanke nos diz na réplica a Krugman é que não há dúvida de
que o rebentamento da bolha imobiliária é o elemento de impulso inicial
determinante: “Certamente, o colapso da bolha imobiliária
foi o elemento-chave de precipitação da crise; a queda dos preços de habitação
diminuiu a riqueza e a despesa, ao mesmo tempo que conduziu a significativas
reduções na construção de residências.” Aparentemente há acordo
mas: “o elemento mais demolidor do rebentamento
da bolha foi a sua influência na geração de um pânico financeiro mais alargado,
incluindo a corrida ao financiamento de retalho e a vendas massivas e
indiscriminadas mesmo de créditos não hipotecários. O pânico por sua vez determinou
a queda brusca da oferta de crédito, conduzindo a economia a um declínio ainda
mais severo do que teria ocorrido sem esse pânico. A minha evidência para esta
reivindicação aponta para que os indicadores de pânico, incluindo os
significativos aumentos nos custos de financiamento das instituições
financeiras e nas subidas agudas dos yields de securities não hipotecárias
sejam melhores indicadores de previsão do tempo e profundidade da recessão do
que as variáveis relacionadas com os preços da habitação, preços de mercado das
hipotecas ou as taxas de delinquência de hipotecas”.
Em resposta
ao pedido de Krugman de melhor explicitação dos mecanismos de propagação de
efeitos, Bernanke considera que uma situação de pânico financeiro tenderá a
afetar empresas e famílias em geral e não apenas aquelas que estão à procura de
crédito. A constituição de poupanças de precaução e a concretização de
despedimentos em massa, determinando a redução da despesa destes últimos e a
constituição de reservas líquidas para fazer face ao futuro incerto. Bernanke
invoca evidências de aumento das poupanças de precaução de empresas e famílias
como prova da intensificação dos efeitos provocados pelo pânico financeiro. Mas
na resposta de Bernanke podemos ainda encontrar leituras sugestivas sobre o
comportamento de variáveis como o investimento residencial, o investimento não
residencial, as despesas reais de consumo e o próprio comércio externo
americano. A finura da análise aponta para que os efeitos iniciais provocados
pelo impacto da bolha imobiliária tenham sido depois fortemente impactados pelo
pânico financeiro. Segundo Bernanke, não só o investimento residencial caiu
mais do que teria caído apenas pelo efeito do quebrar da bolha, mas também o investimento
em capital fixo não residencial acabou por experimentar os efeitos do pânico. E,
além disso, a destruição do PIB só começou a intensificar-se depois do pânico
financeiro se ter instalado. Na modéstia da minha análise, a réplica de
Bernanke parece-me muito consistente e revela mais profundidade do que um
simples artigo de opinião para o NYT.
Krugman já
reagiu (link aqui) . As posições aproximaram-se. Mas Krugman permanece na dele. Os elementos
adicionais de Bernanke não o terão convencido de que o pânico financeiro tenha
acrescentado profundidade e declive à queda das diferentes variáveis. E refugia-se
num argumento final: “termos experimentado
uma recessão tão profunda e prolongada apesar dos bancos terem sido resgatados
mostra os limites de uma perspetiva centrada nos elementos financeiros”.
Não sei se o
debate terá qualquer prolongamento. Fica-me entretanto a ideia de que seria sensato
não ignorar os argumentos de Bernanke. Até porque as realizações concretizadas
nessa matéria depois de 2008 deixam a desejar e não auguram boa coisa para uma
próxima recessão.
Sem comentários:
Enviar um comentário