quarta-feira, 12 de setembro de 2018

O ESTADO DA UNIÃO



(Com um Jean-Claude Juncker aquela hora da manhã lúcido e sóbrio, o que dizer do discurso de Estrasburgo? O que vem ele trazer de esperança a toda a espécie de dúvidas e interrogações?)

O último Estado da União apresentado por Juncker, que não necessariamente o seu último discurso como Presidente da Comissão Europeia, poderia ter um subtítulo aliás referido ao longo da sua intervenção – “A road to Sibiu – Roménia”, local de realização da última conferência de líderes europeus antes das eleições europeias de 2019. Há pois uma dinâmica de aceleração do tempo político europeu e da Comissão em particular. O objetivo é, como sempre, reativo. É preciso apresentar resultados de promessa feitas anteriormente e ter a sua validação como decisões europeias antes e a tempo das eleições.

Com referências de memória histórica ao flagelo das guerras que envolveram a Europa, que entendo importante manter viva para gerações demasiado distraídas e sem memória e cultura históricas, Juncker teve oportunidade de fazer sobressair a sua dimensão humanista defendendo uma Europa mais unida (“United we stand taller”) e sobretudo o aprofundamento da sua soberania, numa era de duplo patriotismo interdependente, amar o País e amar a Europa. Mas o mundo de promessas sobre as quais se levanta a necessidade de mostrar resultados é ciclópica para uma estratégia reativa e de aceleração do tempo para recuperar o dito: a inovação no mercado digital único; o aprofundamento da União Económica e Monetária; a União Bancária; O Mercado de Capitais Europeu; um Mercado Único mais justo; uma União Energética com uma política de liderança climática; uma Agenda de Migrações global e uma União de Segurança, não esquecendo que a Europa Social precisa de deixar de ser um simples ramalhete decorativo para descanso dos corações mais solidários. Mas que agenda!

No mesmo discurso cruzam-se ideias com alcance estratégico (como por exemplo a referência a um outro olhar sobre o continente parceiro África, que emerge no discurso como uma prioridade de geoestratégia) e outras de recorte mais pontual como a questão da mudança de hora.

Quanto ao BREXIT apenas a ressalva e recordatória dos princípios que têm orientado Barnier nas negociações com o Governo conservador de Theresa May.

Esperaria talvez um discurso mais contundente contra os nacionalismos xenófobos e antidemocráticos que têm desafiado despudoradamente as instituições europeias, mas as contradições existentes no Partido Popular Europeu explicam a situação e a lentidão dos avanços para colocar a Hungria e outros países senão em posição de recuo, pelo menos com mais respeito.

Mas de todo o discurso ressalta sobretudo esta ideia de corrida contra o tempo, ou seja a necessidade de ter resultados para apoiar as campanhas de partidos europeístas nas próximas eleições. Já há muito tempo que estas corridas contra o tempo nas instituições europeias deixaram de produzir resultados negociais inesperados e virados para um futuro mais esperançoso. As lideranças políticas europeias são cada vez mais cautelosas e têm o rabinho trilhado pelos eleitorados populistas e xenófobos que ameaçam ter maiores representações parlamentares. Juncker não poderia ter feito provavelmente melhor nas condições políticas atuais. Como referi em post anterior, barrar o crescimento do nacionalismo autocrático e destruidor da União no Parlamento Europeu é seguramente uma prioridade. Mas não chega. Os colossos do PPE e dos Socialistas e Sociais-Democratas têm também de abanar as suas próprias consciências e interesses instalados.

A corrida contra o tempo começou. Mas o tempo da corrida europeia é seguramente um tempo lento. Veremos se consegue transportar para o palco das ideias europeias algo de relevante e de estimulante. Cautelas e caldos de galinha são necessários. O último Economist (link aqui) afiança que os populismos europeus estão no seu pico ou seja que mostram tendência para abrandar com algumas exceções essencialmente determinadas por personalidades carismáticas. Não exageraria a distensão que esta análise pode provocar. Prefiro raciocinar com base nos fatores reais que precipitaram as tentações populistas e nacionalistas. E estes estão aí para desafiar o contra-ataque necessário. Sob que comando?

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