(A tendência do PS para o abismo e argolada de certas
posições assusta e incomoda. O modo como ingénua ou deliberadamente se deixou
enrolar no lio da sucessão da Procuradora Joana Marques Vidal brada aos céus e
irrita profundamente quem vota no PS e não sequer confundir, como eu, com este
folclore da má política em Portugal. E, cereja no cimo do bolo, o por vezes arrogante Embaixador
Seixas da Costa que deve julgar-se um oráculo não tinha melhor síntese do que
clamar que JMV é a procuradora da direita.)
Três evidências
para contextualizar a reflexão.
Primeiro, a
Procuradora Joana Marques Vidal, com todos os seus possíveis defeitos e
virtudes, conseguiu atingir na opinião pública portuguesa uma aceitação que
nenhum outro Procurador tinha conseguido. Não estão em causa alguns atrasos e
contradições de evolução de processos que, por vezes, nos espantam. Mas é um
facto que globalmente o mandato de JMV é considerado por todos positivo,
existindo na opinião pública a expectativa de que finalmente algo vai ser concretizado
em termos de condenação de grandes prevaricadores. Ninguém ignora que a complexidade
do direito processual português nos pode sempre reservar uma surpresa desagradável,
mas o mandato de JMV pode alterar a suspeição que parte da opinião pública
portuguesa foi alimentando em relação à justiça.
Segundo, o
PS tem passado entre os pingos da chuva em matéria de envolvimento de alguns
dos seus elementos a processos de corrupção, plasmados essencialmente no chamado
caso Marquês e suas ramificações. O paradoxo é claro: a governação mais
reformista do PS, a de José Sócrates, pelo menos no primeiro mandato, é também
a mais delicada nessas matérias. Com a habilidade política de António Costa e alguma
sorte, o PS tem conseguido manter-se à margem da evolução desfavorável dos
processos e da condenação implícita que a opinião pública associa a Sócrates. É
por isso nesse trilho de que à justiça o que é da justiça e à política o que é
da política que o partido deve continuar, afirmando a transparência da sua
governação e preparando-se para acatar politicamente, e tirar devido
ensinamento das mesmas, as decisões da justiça.
Terceiro,
embora careça de clarificação legislativa que deveria ter sido promovida, prevalece
em Portugal a tese de que o mandato do Procurador deve ser único e longo, existindo
até um pronunciamento público da própria JMV nesse sentido.
Neste
contexto de evidência, não lembraria ao diabo classificar a Procuradora como
uma procuradora da direita. Pois na sequência de uma incontinência verbal tweeteira, o Embaixador Seixas da Costa
assume a tese e, como não é um qualquer zé-ninguém na história do partido, vem
dar força ao argumento generalizado de que o PS está incomodado com JMV e com a
sua atuação. O PS parece querer brincar com o fogo e nem sequer o facto do
partido estar hoje melhor defendido quanto aos estilhaços do caso Marquês, qualquer
que seja o seu desfecho final, justifica o desplante.
Uma de duas.
Se o PS entende que o critério do mandato único e longo é para respeitar então
assuma a iniciativa legislativa para clarificar de vez essa questão e defenda
perante o Presidente da República e a opinião pública portuguesa essa posição de
forma clara e transparente e mostrando que não tem pedra no sapato quanto à
Procuradora. Uma posição oficial, clara e corajosa que se sobreponha a todos os
canários das redes sociais e assuma as consequências políticas da mesma. Caso
contrário, ou seja se não tiver tomates para esta posição, então admita um novo
mandato mostrando que está preparado para todos os rumos condenatórios que os
processos em curso poderão acarretar, mostrando quem não deve não teme.
Claro que a
Procuradora Joana Marques Vidal pode querer dar uma bofetada de luva branca a toda
esta gente não aceitando um novo mandato. Nesse caso, um novo desafio institucional
estaria criado, o de encontrar um nome à altura da aceitação que conseguiu granjear
na opinião pública.
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