(Uma nova sondagem eleitoral sobre a situação política na
Catalunha mostra a presença resiliente da rebeldia independentista, apesar do
ambiente menos crispado que hoje se vive nas relações com Madrid. Más notícias para Sánchez que não vê na situação
política local qualquer abertura retribuidora do seu esforço de diálogo.)
A fazer fé
na sondagem Sociométrica realizada para o jornal El Español (link aqui), se a Catalunha
fosse hoje às urnas a Esquerra Republicana seria o partido mais votado,
mantendo-se uma maioria absoluta independentista ligeiramente acima dos 50% e
cerca de 53% dos inquiridos confia que a independência será mais tarde ou mais
cedo uma realidade. Sabemos que as sondagens são voláteis. Devem, por isso, ser
olhadas com cautela. Mas analisando objetivamente e sem emoções os dados
obtidos há uma certa coerência nos mesmos. Senão vejamos.
O facto dos
eleitores sondados concederem 25% à Esquerra Republicana é coerente com o maior
pragmatismo político da organização (é seguramente entre os independentistas a
organização menos aventureira) e o eleitorado parece valorar essa posição. Em
simultâneo, a instabilidade do PD de Cat apresentada como Junts per Catalunya é
penalizada, o que significa que as sucessivas tropelias de Puigdemont a partir
do exterior não são do agrado do independentismo. Parece registar-se uma
tendência para um certo realinhamento entre os independentistas, sugerindo que
um novo governo da Generalitat poderia ter uma composição diversa. Essa ideia é
também consistente com alguma perda dos radicais da CUP. Mas o que decorre dos
dados da sondagem (e isso são más notícias para Sánchez e para que se opõem ao
independentismo) é que o constitucionalismo voltaria a perder em pleno terreno
eleitoral, mostrando uma vez mais que a rebeldia é resiliente, veio para ficar
e nas condições em que se manifesta isso a equivale a dizer que a sociedade
catalã continuará fraturada, fortemente fraturada.
Quatro
outras informações são consistentes com este ambiente geral. Primeiro, o
CIUDADANOS de Inês Arrimadas perde o estatuto de partido mais votado, em linha
com as dificuldades de manter uma trajetória de crescimento a nível nacional.
Segundo, o Partido Socialista Catalão recupera alguma percentagem de eleitorado
capitalizando a abertura de Sánchez ao diálogo. Terceiro, compreensivelmente
dada a sua posição face à Catalunha, o PP mantêm-se na margem da irrelevância
política regional. Quarto, a força política resultante da aliança do PODEMOS com
a autarca de Barcelona Ada Colau mantém votação, sobretudo graças ao peso do
governo da Cidade.
Amanhã é dia
de Diada e na rua confrontar-se-ão duas posições. A da Diada como afirmação de
identidade e autonomia. A da Diada como património do independentismo. A
história das Diadas anteriores, sobretudo as mais pujantes e participadas não
autorizam esse argumento que o presidente da Generalitar terá querido fazer
passar. Mas o problema é que a posição dos catalanistas não independentistas,
mas ciosos de afirmar a sua identidade e autonomia, tem hoje condições quase
impossíveis de manifestação das suas ideias. Haverá muita gente neste grupo que
não ousa afirmar em público a sua presença, receando não o peso da pressão
independentista (embora este não seja brando e para menosprezar, antes pelo
contrário), mas antes o risco de serem confundidos com as posições
constitucionalistas. Essa temeridade é o primeiro passo para ceder a rua aos
independentistas, que já deram aliás provas mais do que muitas de serem exímios
em manipular os manuais do agit pro.
Tem razão
LLuís Bassets (link aqui) quando nos diz que não é de uma Catalunha que se
trata mas de duas: “A divisão converteu a Catalunha em duas
nações, em lugar de uma só. E como sucede com as nações, ambas nascidas na
luta, uma contra a outra e na negação mútua de qualquer legitimidade, incluindo
a da sua existência, cada uma desejará celebrar à sua
maneira o 11 de setembro, a Diada nacional que em tempos remotos reunia todos e
que agora serve para exibir a fratura em todo o seu esplendor.”
Entretanto,
a sondagem que nos serve de guia regista apenas 28% de eleitores a defender a
reaplicação do 155º.
Passa também
por aqui a erosão política do governo de Sánchez. A abertura ao diálogo e
sobretudo a paciência político-institucional para ir aguentando a guerrilha de
Torras e seus apoiantes colhe num primeiro momento, aquele que resulta da
passagem da tensão a uma menor crispação. Mas mal esta não crispação se instala
o diálogo sem resultados à vista é fator de erosão. Não terá sido por acaso que
Pedro Sánchez no seu resumo político dos 100 dias de governação omitiu qualquer
referência à situação política na Catalunha. O jogo político continuará
bloqueado enquanto, primeiro, o independentismo, apesar de realinhado internamente,
continuar a dominar os atos eleitorais e, segundo, enquanto a rebeldia
resiliente continuar a projetar a sua afirmação no curto prazo e na aceleração
do tempo político. Se essa rebeldia assumisse uma postura de concretização a
mais longo prazo isso talvez concedesse alguma margem ao aprofundamento do
diálogo político com resultados. Por isso, à menor escorregadela a crispação
regressará.
Sem comentários:
Enviar um comentário