quinta-feira, 20 de setembro de 2018

DANNY LANÇA COSTA


A Anabela e o Agualusa têm vindo a comissariar um magnífico programa cultural em simultâneo à realização da “Feira do Livro do Porto” e a Cidade tem correspondido em manifestações de interesse e presença. Na Sexta ao final da tarde, fui ao Auditório da Biblioteca Almeida Garrett (a abarrotar, talvez dominantemente de gente de meia idade) ouvir a conversa que trouxe ao Porto a mítica figura do maio de 68 que é Daniel Cohn-Bendit (o interlocutor era o nosso Rui Tavares). Aos 73 anos, e abstraindo dos inevitáveis aspetos físicos, Danny permanece igual a si próprio – na vivacidade, na espontaneidade, na capacidade de expressão, na abertura e na indomável atração pelo sonho – mas surge também notoriamente amadurecido pela aprendizagem de uma vida pública intensa e diversa. Nem tudo o que afirma é pacífico ou, mesmo, suficientemente fundamentado, mas a sua simpatia presencial e comunicacional e o conhecimento do mundo que patenteia suprem as eventuais falhas ou lacunas.

Apontamentos que retive? Aqui deixo uma dezena, sem qualquer esforço na procura de um rigor que manifestamente também não estava na agenda: (i) a dificuldade de as sociedades aceitarem democraticamente os projetos do futuro; (ii) o papel determinante do imprevisto na evolução dos acontecimentos; (iii) a engenhosa formulação de uma ideia segundo a qual a França esperou mais de 150 anos depois da Revolução de 1789 até que chegasse a democracia em 1945 (consagração do direito de voto das mulheres); (iv) as deceções da “Primavera Árabe” (Tunísia como exceção?) e a oportunidade/possibilidade de um processo laico (um partido islamo-democrático?) no seio do mundo muçulmano; (v) os Estados Unidos da Europa como imperativo e a “utopia realista” de hoje, uma batalha que só se ganha socialmente e supranacionalmente (vidé as questões do clima e dos migrantes); (vi) Merkel como alguém que se impôs num mundo de homens e que teve dois momentos especialmente marcantes (o abandono do nuclear e o acolhimento dos refugiados com que “salvou a honra da Europa”), mas também como alguém com a energia em perda e menos Europa dentro de si pelas suas origens a Leste; (vii) Macron como o único agente político europeu atual capaz de empurrar Merkel, ele que é um liberal de boas famílias parisienses que teve a sua revolução emancipadora pela paixão dos 17 anos e que sente como ninguém a necessidade da Europa; (viii) o Brexit como fenómeno demonstrador de que a explosão da Europa podia acontecer e como fenómeno potenciador de uma crescente perceção de que a Europa não vai acabar e pode até ser redefinida; (ix) vencer os populistas só é pensável se não se cometer o erro de os atacar no terreno deles; (x) a enorme e humilhante derrota da Esquerda no Brasil e na América Latina.


Houve ainda um momento mais lusitanamente orientado quando Danny se referiu ao atual primeiro-ministro português como “muito impressionante” e “a primeira pessoa em que penso para Presidente da Comissão Europeia”. Não sei se esta é uma matéria que possa estar nas cogitações de António Costa, embora não me pareça tal. Sei, isso sim, que a hipótese não seria de todo absurda, dadas as manifestas competências políticas e negociais do nosso primeiro-ministro e a respetiva compatibilidade com o perfil que melhor se ajustaria à pugna pelo interesse europeu nos dias que correm. Mas admito, ainda, que a capacidade de sacrifício de Costa ao serviço de uma renovação do projeto europeu possa não ir a um tão elevado ponto...

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