É sempre precário formular juízos de
acontecimentos focados no poder de imagem da televisão. Mas não pode ficar-se
indiferente à multidão concentrada na grande manifestação republicana de Paris,
com a Place de la République a funcionar como local a que afluíram todas as
boas vontades.
O Le Monde,
praticamente ao vivo, salientava sobretudo o aparente sentimento de unidade que
percorria toda aquela massa humana, que pelo menos durante uma tarde inesquecível
de domingo fazia regressar à Paris do nosso contentamento e ilusões de
juventude o centro nevrálgico da liberdade, da democracia, da tolerância, do
respeito por todos os credos e pensamentos, sem o incómodo da presença da
Frente Nacional que optou por não partilhar os valores da República.
A maré humana e o que ela significa após os
acontecimentos trágicos da semana não podem ser ignoradas. Mas, tal como outras
grandes manifestações nos ensinaram, o diabo está nos acontecimentos
posteriores. Será que todas as lideranças políticas ali presentes estarão
conscientes do esforço de coerência e de consistência que lhes é exigido e de
que é necessário dar provas na condução da vida política nos dias futuros? Será
que por exemplo a informação estratégica sobre as ameaças do islamismo radical
vão circular de modo mais fluido entre os serviços de segurança inter e
intra-países? Será que todos os líderes ali presentes vão resistir às derivas
securitárias que pairam nas suas cabeças e nos seus gabinetes? Será que as políticas
sociais vão erradicar de vez as tentações da guetização?
As coisas não vão certamente mudar por simples
magia. Mas se pelo menos a imagem de força e unidade perdurar algum tempo nas
cabeças dos que abriam a grande marcha é provável que algum resultado fique e
que a memória do rassemblement parisiense não se desvaneça.
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