E ao quarto dia o xadrez Grécia (SYRIZA) versus
União Europeia torna-se mais complexo, sobretudo porque na minha interpretação
não há neste momento apenas um tabuleiro, mas dois. Como é que isto é possível?
A questão é que neste momento não existe apenas a defesa ou implosão do euro e
obviamente da própria União Europeia. Ou seja, não temos apenas o tabuleiro
económico. Há também o tabuleiro político e o centro de todos os fogos o
problema Rússia – Ucrânia. O posicionamento da EU face à plutocracia de Moscovo
e às derivas bélicas e invasivas de grupos provavelmente pertencentes à sua
vasta área de proteção de interesses tem vindo a evidenciar uma cada vez maior
dificuldade de geração de consensos credíveis e eficazes. O Presidente do
Conselho Europeu, o polaco Donald Tusk, não é propriamente um homem distanciado
face aos soviéticos e capaz de grandes negociações diplomáticas e compreende-se
porquê, é só compreender a história. Alguns países bálticos são do tipo “mata e
esfola”, até porque não são tão potencialmente interessados numa abertura económica
da Rússia como outros membros da União Europeia. A combinação de tudo isto com
a questão do gás natural baralha ainda mais o panorama. Mas agora, com o SYRIZA
a suscitar velhos respeitos e proximidades com a Rússia, a formação de
consensos será ainda mais problemática, até porque a precipitação do Conselho
Europeu gerou um comunicado do qual aparentemente o novo Governo grego não foi informado.
Os dois tabuleiros não são totalmente estanques,
pelo que a complexidade dos posicionamentos ultrapassará a nossa capacidade de
os perceber com uma visão exterior. Talvez seja a altura certa para se
revisitar a história sobre o estado da arte em Uniões Políticas.
Na frente económica, as réplicas pós SYRIZA
sucedem-se e o Financial Times continua a ser um espaço de eleição para
compreender os confrontos.
Do lado dos que se opõem claramente à anulação parcial
de dívida grega, regista-se a novidade da rejeição ser agora acompanhada da denúncia
do que essa linha de argumentação considera ser a “roleta russa” (sem qualquer
alusão maldosa ao tabuleiro político) da política económica defendida pelo
governo SYRIZA. Gideon Rachman chama-lhe engenhosamente a “voodoo economics”. Essa linha de argumentação terá sempre a ajuda
preciosa da pressão dos mercados e estes começam a querer influenciar o debate,
numa anunciada maneira de influenciar as opções políticas.
Do lado dos que vêm a anulação parcial de dívida
como a única modalidade sustentada de preservar a não implosão do euro, há que
registar hoje a chegada a esta frente de um Vice-Presidente da Morgan Stanley e
antigo chefe do FMI Europa, Reza Moghadan, que teve envolvimento nas negociações
com a Troika entre 2010 e 2014 (o primeiro ato de contrição conhecido?).
A forma como conclui o artigo no FT é
esclarecedora:
“A zona euro ultrapassou os seus tabus acerca de
resgates, reestruturação da dívida privada e união bancária. Tal como o SYRIZA
precisa de ultrapassar a relutância grega em proceder a reformas estruturais
mais profundas, a Europa necessita de ultrapassar os seus tabus em matéria de
perdão de dívida”.
Mas que ato de contrição!
Tal como o cartoon que abre este post e a crónica de Philip Stephens o sugere, será que Merkel vai acordar ou teimará em sublimar
a situação procurando matar o pesadelo?
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