(Output gap na zona Euro)
O paradoxo europeu está ao rubro. Do ponto de vista
da economia global, as perspetivas anunciadas para 2015 (ver a crónica de Martin Wolf) parecem abrandar a
preocupação de uma estagnação à escala global, graças sobretudo à recuperação
da economia americana, algo de similar ao que aconteceu no fim dos anos 90 nas
crises cambiais asiáticas, mas aí, então, com a economia americana a completar
a sua mais longa expansão de sempre.
Porém, se as expectativas globais amainaram, o
paradoxo europeu subsiste. E não estou a falar dos críticos 11 dias de janeiro
de 2015, que Gawyn Davies no Financial Times tão bem assinala: a 14, o Tribunal
Europeu de Justiça pronuncia-se sobre a legalidade das compras de dívida pública
por parte do BCE; a 22, o BCE definirá o montante e o modelo de injeção monetária
(quantitative easing) que aplicará ao
estado deflacionário da economia europeia; a 25, os Gregos decidirão do seu
destino. Estou simplesmente a falar do estado lastimável em que o quadro
macroeconómico europeu se encontra. Simon Wren-Lewis no Mainly Macro chama-lheo “Escândalo da Zona Euro” e os números
apontam para esse registo.
Mas que números?
O chamado “output gap”
que os macroeconomistas utilizam como ferramenta das suas observações mede, com
todas as imperfeições conhecidas e fortemente debatidas ao nível técnico, a
diferença para um dado ano entre o produto potencial da economia e o produto
efetivo da mesma. Quando esse “output gap”
é negativo, o indicador mede o volume de PIB que seria possível fazer aumentar
sem implicar pressão inflacionária para além da meta de estabilização de preços
anteriormente assumida.
O gráfico elaborado por Wren-Lewis traz-nos um
panorama decisivamente preocupante. Como seria de esperar, os países atingidos pelos
resgates financeiros e pelas consequentes políticas de austeridade (com a Grécia
à cabeça) apresentaram em 2013 e 2014 os gaps mais negativos. Mas como
Wren-Lewis bem o assinala, praticamente toda a zona euro apresenta valores
negativos para o indicador, incluindo a própria Alemanha.
Como qualquer estudante iniciado na economia
sabe, um output gap negativo pode ser a consequência de muitas causas
indesejadas ou não previstas, regra geral acomodadas no conceito de choques
(internos ou exógenos à economia). Mas as evidências disponíveis mostram que
uma fração substancial do desastre europeu descrito pelo gráfico acima resulta
das próprias decisões da política económica e da política fiscal restritiva que
os alemães conseguiram imprimir na zona euro. Wren-Lewis invoca para esta
conclusão a pertinente observação que resulta do confronto entre o défice
estrutural (sem medidas extraordinárias e ponderando os efeitos da conjuntura)
previsto pela OCDE para a zona euro e o previsto para a OCDE como um todo. Os
valores são eloquentes: na zona euro, esse défice estrutural corresponde a um
excedente estrutural de 1% do PIB; na OCDE, é mesmo défice e corresponde a 1%
do PIB. Por outras palavras: ter um excedente estrutural de 1% do PIB
(sugerindo por isso política fiscal restritiva) com um quadro geral de output
gap negativo praticamente em todos os países é de loucos e irresponsáveis. A
política fiscal restritiva está a destruir produto potencial e a arquitetura
europeia não dá mostras de entender o non-sense
de tudo isto.
Poderá dizer-se que o establishment económico e
político que domina as instituições europeias acredita que a zona euro vai
vencer o problema à custa dos outros blocos económicos, com perspetivas mais
risonhas para 2015, vendendo para esses mercados. Mas tal posição equivale a
ignorar o poderoso efeito do comércio intra-EU e intra zona euro, o qual tenderá
a não seguir as mesmas perspetivas risonhas com a permanência das políticas
fiscais restritivas, sobretudo nos países em que o aumento do produto não só é
vital para combater o espectro da deflação, mas também é compatível com o
referencial de estabilidade dos preços.
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